BIOPLÁSTICOS: BENEFÍCIOS SUSTENTÁVEIS
E ASCENSÃO DA PRODUÇÃO
Daniel Penido de Lima Amorim
Fundação Dom Cabral - FDC, SP
Economista, pesquisador em Economia e Finanças na Fundação Dom Cabral.
RESUMO
Bioplásticos são plásticos de base biológica ou biodegradáveis e, sobretudo, aqueles que apresentam ambas as características. O objetivo deste estudo foi descrever os principais benefícios sustentáveis atribuídos aos bioplásticos e analisar a dinâmica do mercado mundial desse material. Alguns potenciais benefícios dos bioplásticos nos aspectos ambiental e socioeconômico são: reduzir a emissão dos gases que causam o aquecimento global, oferecer melhores opções de destinação dos resíduos, reduzir a dependência do petróleo e proporcionar relativamente maior geração de empregos que outras atividades produtivas. Para analisar a dinâmica do mercado mundial de bioplásticos, utilizou-se de dados e projeções baseados na capacidade produtiva de 115 empresas ao redor do mundo. Esses dados foram provenientes da Biopolymer Platform, uma base de dados pertencente ao Institute for Bioplastics and Biocomposites da Hannover University. Os resultados encontrados projetam um forte crescimento tanto da capacidade produtiva quanto do tamanho do mercado em termos de valor produzido. Enquanto a capacidade produtiva deverá ser multiplicada por mais de quatro vezes de 2014 até 2019, o tamanho do mercado deverá chegar, em 2018, a quase três vezes o valor registrado em 2014.
Palavras-chave: bioeconomia; bioplásticos; plásticos; sustentabilidade; desenvolvimento sustentável.
BIOPLASTICS: SUSTAINABLE BENEFITS AND RISING PRODUCTION
ABSTRACT
Bioplastics are bio-based or biodegradable plastics and, above all, those having both characteristics. The objective of this study was to describe the main sustainable benefits attributed to bioplastics and to analyze the world market dynamics of this material. Some potential benefits of bioplastics in environmental and socioeconomic aspects are: reducing the emission of gases that cause global warming, offering better waste disposal options, reducing dependence on oil, and providing relatively greater job creation than other productive activities. To analyze the dynamics of the global bioplastics market, data and projections based on productive capacity of 115 companies worldwide were used. These data came from the Biopolymer Platform, a database belonging to the Institute for Bioplastics and Biocomposites of the Hannover University. The results found show a strong growth of both the productive capacity and the size of the market in terms of the value produced. While production capacity should be multiplied by more than four times from 2014 to 2019, the size of the market should reach in 2018 almost three times the value registered in 2014.
Keywords: bioeconomics; bioplastics; plastics; sustainability; sustainable development.
BIOPLÁSTICOS: BENEFICIOS SOSTENIBLES E ASCENSIÓN DE LA PRODUCCIÓN
RESUMEN
Los bioplásticos son plásticos de base biológica o biodegradables y, sobre todo, aquellos que presentan ambas características. El objetivo de este estudio fue describir los principales beneficios sostenibles atribuidos a los bioplásticos y analizar la dinámica del mercado mundial de ese material. Algunos potenciales beneficios de los bioplásticos en los aspectos ambientales y socioeconómicos son: reducir la emisión de gases que causan el calentamiento global, ofrecer mejores opciones de destino de los residuos, reducir la dependencia del petróleo y proporcionar relativamente mayor generación de empleos que otras actividades productivas. Para analizar la dinámica del mercado mundial de bioplásticos, se utilizaron datos y proyecciones basados en la capacidad productiva de 115 empresas alrededor del mundo. Estos datos proceden de Biopolymer Platform, una base de datos perteneciente al Institute for Bioplastics and Biocomposites de Hannover University. Los resultados encontrados proyectan un fuerte crecimiento tanto de la capacidad productiva y del tamaño del mercado en términos de valor producido. Mientras que la capacidad productiva debería multiplicarse más de cuatro veces desde ٢٠١٤ hasta ٢٠١٩, el tamaño del mercado debería alcanzar, en 2018, casi tres veces el valor registrado en 2014.
Palabras clave: bioeconomía; bioplásticos; plásticos; sostenibilidad; desenvolvimiento sustentable.
1 INTRODUÇÃO
Plásticos são essenciais por suas aplicações nos mais variados produtos, desde em simples embalagens de alimentos consumidos diariamente pelas pessoas, até em componentes das máquinas mais complexas utilizadas na indústria. Tais materiais foram desenvolvidos pela primeira vez há mais de um século (Lackner, 2015) e nas últimas cinco décadas tiveram sua diversidade multiplicada vinte vezes em virtude de avanços tecnológicos (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico [OCDE], 2013).
Considerando essa diversidade dos compostos plásticos, é possível diferenciá-los conforme suas matérias-primas e o impacto ambiental a elas vinculado. Enquanto os petroplásticos – plásticos convencionais – são derivados do petróleo, os bioplásticos, geralmente, são desenvolvidos a partir de materiais de base biológica. A degradação dos plásticos convencionais traz a atmosfera o dióxido de carbono que esteve concentrado nas bacias de petróleo por milênios. Em contraste, alguns bioplásticos apresentam em seu ciclo de vida tanto a captura quanto a liberação de dióxido do carbono, uma vez que são produzidos a partir de vegetais que captam essa molécula ao realizar a fotossíntese (Iles & Martin, 2013; Yu, & Chen, 2008). Em alguns casos, seu processo produtivo pode chegar a captar um volume de gases superior àquele liberado (Dornburg, Hermann, & Patel, 2008; Mores, 2013).
Durante várias décadas os bioplásticos tiveram dificuldades em competir no mercado com os petroplásticos. Entretanto, a partir de 2004 o preço do petróleo elevou-se, impactando os custos dos plásticos convencionais (Lackner, 2015). Além disso, os bioplásticos tornaram-se ainda mais competitivos devido aos avanços tecnológicos que proporcionaram tanto a redução de seus custos de produção, quanto o desenvolvimento de novos compostos e aplicações (Philp, Bartsev, Ritchie, Baucher, & Guy, 2012). Ademais, constatou-se que além de proporcionarem menor impacto ambiental, também geram benefícios socioeconômicos. A julgar por isso, alguns governos passaram a adotar políticas de fomento ao uso de bioplásticos (OCDE, 2013). Em decorrência dessa conjuntura favorável, apesar de os bioplásticos ainda corresponderem a uma pequena parcela de todo o mercado de plásticos, sua produção vem apresentando forte crescimento (Bohlmann., 2007)
Ainda dentro desse contexto, a bioeconomia foi difundida como um conjunto de atividades econômicas que utilizam da biotecnologia para desenvolver produtos, gerando emprego e renda, ao mesmo tempo que contribui para solucionar diversos problemas ambientais que necessariamente terão que ser sanados para o alcance uma sociedade sustentável (European Comission, 2012; OCDE, 2001, 2009, 2013).
Os bioplásticos se destacam quando comparados com outros produtos da bioeconomia porque além de contribuírem para a mitigação de vários problemas ambientais, também apresentam maiores impactos socioeconômicos (Nattrass et al., 2016; OCDE, 2013).
Tendo em vista a relevância da bioeconomia e o destaque dos bioplásticos dentre seus produtos, este estudo objetivou descrever os principais benefícios sustentáveis atribuídos a esses materiais e analisar o crescimento do seu mercado no âmbito mundial. Assim, contribui por disseminar informações sobre negócios que, além de oportunos, podem conduzir a sociedade em direção ao desenvolvimento sustentável. Cabe salientar que não se pretende tratar dos diversos tipos existentes de bioplásticos e de suas estruturas químicas – abordagem que prevalece na literatura –, mas, sim, avaliar a dinâmica do mercado pela perspectiva econômica.
Este estudo está dividido em cinco seções. Após esta introdução, a Seção 2, com embasamento na literatura, define bioplásticos conforme as principais características desses materiais. Além disso, essa seção discute os problemas derivados do consumo dos plásticos a base de petróleo, bem como os principais benefícios ambientais e socioeconômicos que podem ser proporcionados pela substituição destes por bioplásticos. A Seção 3 apresenta a metodologia do presente estudo. Já a Seção 4 apresenta a análise dos dados do mercado mundial de bioplásticos. Por fim, a Seção 5 apresenta a conclusão.
2 REVISÃO DA LITERATURA
A revisão da literatura deste estudo busca descrever os benefícios sustentáveis dos bioplásticos. Contudo, de antemão, é necessário mostrar quais características definem esses materiais.
2.1 Definindo bioplásticos
Os bioplásticos não são conceitualmente novos. Entretanto, a descoberta de grandes reservas petrolíferas após a Segunda Guerra Mundial interrompeu o desenvolvimento desses materiais, uma vez que seus preços não eram competitivos frente aos dos petroplásticos (Iles & Martin, 2013). Nas últimas décadas a quantidade de pesquisas sobre bioplásticos aumentou consideravelmente (Freemantle, 2005; Queiros & Collares-Queiroz, 2009) e sua produção cresceu associada à capacidade desses materiais serem sustentáveis nos aspectos ambiental, social e econômico (Iles & Martin, 2013; OCDE, 2013).
O grupo dos bioplásticos abrange uma ampla variedade de compostos com diferentes propriedades e aplicações, reunindo alternativas sustentáveis para muitos materiais convencionais (European Bioplastics, 2016; Shen, Haufe, & Patel, 2009). O Forum for Bio-Based Innovation in Public Procurement [InnProBio] (2015a, p. 1) define bioplástico sucintamente como aquele “produto total ou parcialmente derivado da biomassa”. Por sua vez, biomassa é um termo geral usado fazer referência a matérias-primas renováveis, como madeira, palha, açúcar, milho, mandioca, algas ou resíduos biológicos (InnProBio, 2015b).
Para avançar na direção de uma definição mais robusta, é necessário elucidar duas características associadas aos bioplásticos: i) ser de base biológica significa o mesmo que derivado da biomassa; ii) ser biodegradável indica que micro-organismos do ambiente podem decompor o plástico sem causar impacto ambiental. Plásticos duráveis não são biodegradáveis, mas podem ser de base biológica. Assim, com suporte em European Bioplastics (2016), Hogan, JayaSuriya, Uppala, Holgate e Skero (2015), bem como em Lackner (2015), os bioplásticos são definidos como plásticos de base biológica ou biodegradáveis e, sobretudo, aqueles que apresentam ambas as características. A Figura 1 contribui para a compreensão da definição adotada.
Figura 1. Bioplásticos conforme suas características.
Fonte: Adaptado de Lackner, M. (2015). Bioplastics: biobased plastics as renewable and/or biodegradable alternatives to petroplastics. In: Standen, A. (Ed.). Kirk-Othmer Encyclopedia of Chemical Technology (6a ed., Cap. 6). doi:10.1002/0471238961.koe00006
Cabe ressaltar que, apenas uma dessas características é suficiente para classificar um polímero como bioplástico. Isto é, mesmo que ele seja de base biológica e não biodegradável ou, do contrário, seja derivado do petróleo e biodegradável, ainda assim é considerado um bioplástico. Também podem ser considerados parte desse grupo os plásticos que são misturas entre aqueles de base biológica com plásticos derivados do petróleo ou aditivos. Tais componentes adicionais modificam e otimizam o material, garantindo, assim, propriedades competitivas a determinados tipos de bioplásticos (European Bioplastics, 2016; Hogan et al., 2015; Lackner, 2015).
2.2 Benefícios sustentáveis dos bioplásticos
Existem vários benefícios que podem ser proporcionados pela adoção dos bioplásticos, os quais dizem respeito aos aspectos ambientais e socioeconômicos. Dentre eles, destacam-se: reduzir a emissão dos gases que causam o efeito estufa, oferecer melhores opções de destinação dos resíduos sólidos, reduzir a dependência do petróleo e proporcionar relativamente maior geração de empregos do que outras atividades produtivas. Esses benefícios são discutidos em maiores detalhes a seguir.
2.2.1 Benefícios ambientais
Em primeiro lugar, a adoção dos bioplásticos deve ser incentivada porque esses materiais poluem, significativamente, menos a atmosfera em comparação com os plásticos derivados do petróleo. A eliminação de alguns bioplásticos emite um volume pequeno de gases causadores do efeito estufa. Outros chegam até a apresentar emissão negativa, quando considerado todo o ciclo de vida do produto (Dornburg, Hermann, & Patel, 2008; Mores, 2014; OCDE, 2013). Isso se deve ao fato de a biomassa – utilizada na produção de determinados bioplásticos – ser originada de vegetais que captam o gás carbônico do ambiente para realizar a fotossíntese (Brito, Agrawal, Araújo, & Mélo, 2011; Iles & Martin, 2013; Yu, & Chen, 2008). Deste modo, esses materiais contribuem para mitigar as mudanças climáticas ou o aquecimento global (Morales, Pulido, Ticas, & Trigo, 2009; Mores, 2013; OCDE, 2013).
Contudo, o problema da poluição causada pelos plásticos convencionais não se restringe a emissão de gases, estando também fundada na destinação final dada aos seus resíduos sólidos. Cerca de 80 milhões de toneladas de plásticos são descartados globalmente por ano, das quais pelo menos 25 milhões de toneladas se acumulam no ambiente, acabando até mesmo nos oceanos (Ojeda et al., 2009; Sudhakar, Doble, Murthy, & Venkatesan, 2008). Nomeadamente, foi constatada uma grande concentração de plásticos em determinadas regiões dos oceanos, acumulando substâncias tóxicas que são extremamente nocivas tanto a fauna marinha quanto à saúde humana (Rios, Jones, Moore, & Narayan, 2010). Além disso, microplásticos resultantes da degradação parcial de plásticos oxo-fragmentáveis foram encontrados no interior de uma grande diversidade de organismos (OCDE, 2013; Philp et al., 2012; Queiroz, 2015).
Ainda nessa lógica, a disposição dos plásticos convencionais em aterros sanitários também é problemática. Os plásticos são um dos principais resíduos coletados nas cidades. Quando destinados aos aterros, ocupam um grande volume desses espaços e podem demorar centenas de anos para se decompor (Brito et al. 2011; Coutinho et al. 2004; Philp et al., 2012; Wright & Giovinazzo, 2004). Em contraste, os bioplásticos compostáveis e mesmo os duráveis – não biodegradáveis – são capazes de contribuir na mitigação desses problemas. Enquanto os compostáveis podem ser desviados dos aterros e resultar apenas em matéria orgânica, a qual serve, inclusive, como adubo agrícola, os duráveis podem entrar no fluxo de reciclagem já estabelecido dos plásticos convencionais de composição química parecida (InnProBio, 2015b; OCDE, 2013; Philp et al., 2012).
2.2.2 Benefícios socioeconômicos
A produção mundial de plásticos cresceu quase que incessantemente desde a década de 1960, atingindo 311 milhões de toneladas no ano de 2014 (Plastics Europe, 2015). Em meio a esse crescimento vieram novas aplicações nas mais diversas finalidades (Iles & Martin, 2013; Philp et al., 2012). Levando em conta essa onipresença pode-se presumir que seja pouco provável que a demanda por esses materiais venha a reduzir-se nas próximas décadas.
A produção dos plásticos a base de petróleo, os quais hoje dominam o mercado, depende da manutenção dos níveis de extração de sua matéria-prima, o petróleo (Bohlmann, 2007). Entretanto, existem indícios de que a dificuldade de se encontrar novas reservas de petróleo é crescente. Ademais, a extração em reservas cujo acesso é complexo implica em maiores custos de produção. Consequentemente, há uma tendência de os preços do petróleo aumentarem com o passar do tempo (Owen, Inderwildi, & King, 2010; Queiroz, 2015).
Nos anos seguintes a 2004 prevaleceram preços do barril de petróleo bem acima daqueles registrados na década de 1990. Embora esse valor tenha caído fortemente em 2014 devido a um crescimento repentino da oferta, o mercado indicou convergir para um reequilíbrio ainda em 2016. O Banco Mundial (2016a) prevê uma recuperação gradual desse preço até o ano de 2025. A Figura 2, a seguir, apresenta os dados históricos do valor do barril de petróleo, bem como pontos que são estimativas desse banco para o preço.
A cogitar por esse senário, depender do petróleo tende a se tornar cada vez mais caro e arriscado (Owen, Inderwildi, & King, 2010). Por outro lado, a biomassa destaca-se como matéria-prima alternativa para a produção de plásticos que poderiam substituir aqueles a base de petróleo (InnProBio, 2015b; Philp et al., 2012). Ademais, a questão das propriedades dos plásticos desenvolvidos a partir de biomassa não é um grande problema devido a atual existência de um bioplástico alternativo para 85% dos plásticos convencionais (Shen, Haufe, & Patel, 2009).
Figura 2. Preço do barril de petróleo (1991-2025).
Fonte: Elaboração própria com dados da série histórica do Banco Mundial (2016b). Global Economic Monitor Commodities (base de dados). Recuperado de http://databank.worldbank.org/data/reports.aspx?source=Global-Economic-Monitor-(GEM)-Commodities, bem como com dados de projeções do Banco Mundial (2016a). Commodity markets outlook: from energy prices to food prices: moving in tandem? (Relatório de Pesquisa/2016). Washington, The World Bank. Recuperado de <http://pubdocs.worldbank.org/en/328921469543025388/CMO-July-2016-Full-Report.pdf/.
A grande barreira para essa substituição reside no fato de os bioplásticos ainda serem mais caros que os plásticos convencionais (Bohlmann, 2007; OCDE, 2013). Porém, um possível impacto sobre os preços ocorreria na medida em que os bioplásticos tomassem gradativamente maiores parcelas do mercado de plásticos, uma vez que ganhos de escala, decorrentes do maior volume produzido, ocasionariam um ciclo de redução de preços (OCDE, 2013; Philp et al., 2012).
Além disso, a produção de bioplásticos ainda pode absorver muitos avanços tecnológicos (Queiros & Collares-Queiroz, 2009), ao contrário daquela dos petroplásticos que apresenta hoje um avançado nível de maturidade e eficiência. Avanços na biologia sintética podem incorrer em forte redução do custo de produção dos bioplásticos (Iles & Martin, 2013; Clark e Deswarte, 2008; OCDE, 2013; Philp et al., 2012). Com isso, apesar de atualmente os bioplásticos ainda serem mais caros, com o passar do tempo, em decorrência de questões associadas tanto ao mercado quanto à pesquisa e desenvolvimento (P&D), são esperados valores tão competitivos quanto os dos plásticos convencionais.
Não obstante, o crescente reconhecimento dos benefícios sustentáveis dos bioplásticos pode favorecer seu consumo, mesmo enquanto seu preço for superior ao dos plásticos convencionais. Carus, Partanen e Dammer (2016) realizaram um survey cujas respostas demonstraram que quase 85% dos profissionais vinculados à bioeconomia estariam dispostos a pagar pelos bioplásticos um valor superior àquele dos plásticos convencionais. De forma mais ampla, Morales et al. (2009) citam a Europa e o Japão como mercados nos quais os consumidores geralmente têm grande interesse em produtos que apresentam menores impactos ambientais e, por isso, estariam dispostos a pagar mais por eles. No Brasil, Kruter, Barcelos e Silva (2012) realizaram um survey e encontraram resultados que evidenciam que os consumidores preferem comprar produtos cujas embalagens sejam feitas de bioplásticos, ainda que alguns não estivessem dispostos a pagar mais por isso.
Quanto à possibilidade de expansão da produção de bioplásticos, a América Latina apresenta vantagens comparativas em relação aos outros continentes. Isso se deve a sua disponibilidade de terras férteis (Queiros & Collares-Queiroz, 2009; OCDE, 2013) e a regulamentação menos rigorosa sobre produtos geneticamente modificados em seus países (Janssen & Rutz, 2011; OCDE, 2013; Philp et al., 2012). A Ásia também dispõe de um bom acesso às matérias-primas e um quadro de políticas industriais favoráveis, apesar de, nos países mais desenvolvidos desse continente, ocorrer uma maior restrição aos produtos geneticamente modificados (Aeschelmann & Carus, 2015; OCDE, 2013). Na Europa a forte regulamentação sobre os produtos geneticamente modificados pode chegar a dificultar o aprimoramento do processo produtivo dos bioplásticos, caso mudanças não ocorram na legislação (Philp et al., 2012).
Os benefícios socioeconômicos dos bioplásticos vão além da não dependência do petróleo. Tem sido registrado um forte impacto socioeconômico da bioeconomia na União Europeia, bem como, particularmente, em alguns países como Estados Unidos, Espanha, Bélgica e Canadá (Nattrass et al., 2016; OCDE, 2013). Uma relevante contribuição em termos de geração de emprego e renda foi associada a essa indústria. Por exemplo, a Eurpean Comission (2012) relatou que, em 2009, a bioeconomia na União Europeia girava 2 trilhões de Euros em volume de negócios ao ano e empregava mais de 22 milhões de pessoas, o equivalente a cerca de 9% de toda a força de trabalho do conjunto de países.
A produção de bioplásticos gera mais empregos mesmo em comparação com aquela de outros produtos de base biológica como biogás, biodiesel e bioetanol. Isso ocorre porque a cadeia produtiva dos bioplásticos é mais complexa do que a desses outros produtos (Essel, 2016). A Figura 3 ilustra como se dava essa geração de empregos entre algumas atividades que compunham a bioeconomia da União Europeia em 2013.
Figura 3. Média de empregos gerados por 1 milhão de toneladas de produto de base biológica (2013).
Fonte: Adaptado de Essel, R. (2016, janeiro). Bio-based building blocks and polymers in the world: production trends and sustainability [apresentação]. Conference Organised by the Danish Society of Engineers, Copenhagen.
Dentre os segmentos mostrados no gráfico, destacam-se as atividades produtivas ligadas aos bioplásticos e à borracha – tratadas em conjunto –, as quais foram aquelas que mais geraram empregos por tonelada produzida, principalmente, nas fábricas que convertem as matérias-primas em produtos acabados. Apesar de o gráfico representar a geração de empregos restrita à União Europeia, é provável que em outros continentes prevaleça uma lógica semelhante nas cadeias produtivas de produtos de base biológica.
As críticas comumente associadas aos bioplásticos dizem respeito a uma possível competição pelas terras que poderiam ser usadas para produzir alimentos. Outro ponto crítico é ausência de infra-estrutura para a compostagem dos plásticos biodegradáveis (Philp et al., 2012).
3 METODOLOGIA
Este estudo tem caráter descritivo, assim como exploratório, e focou tanto na descrição dos benefícios sustentáveis dos bioplásticos quanto na apresentação de informações sobre o mercado mundial desses produtos. Enquanto a descrição dos benefícios sustentáveis foi realizada mediante revisão da literatura, a avaliação do mercado mundial exigiu a coleta e análise de dados quantitativos. Todos os dados apresentados neste estudo foram coletados por meio da internet.
Buscando apresentar a dinâmica do mercado mundial de bioplásticos, foram adotados os dados correspondentes ao agregado de registros de capacidade produtiva das empresas de bioplásticos ao redor do mundo, bem como projeções de capacidade produtiva e tamanho do mercado. Tais dados foram provenientes da chamada Biopolymer Platform, uma base de dados mantida pelo Institute for Bioplastics and Biocomposites (doravante, IFBB, n.d.) da Hannover University – uma instituição de ensino alemã. Cabe destacar que até mesmo as projeções foram realizadas pelo IFBB.
Adentrando na metodologia da Biopolymer Patform, a mesma congrega uma vasta gama de fontes de dados para chegar às estatísticas disponibilizadas. Dentre essas fontes, destacam-se as respostas coletadas por meio da aplicação de questionários – survey – preenchidos por representantes das empresas que compõe o mercado relevante de bioplásticos. Em 2014, cerca de 115 empresas tinham um papel expressivo na produção mundial de bioplásticos. Dentre elas, aquelas que apresentavam produção superior a 25 mil toneladas ao ano eram: Basf, Braskem, Cereplast, Innovia Films, Limagrain, Nature Works, Novamont, Toyota Tsusho, Wuhan Huali e as fornecedoras de embalagens bio-PET (IFBB, n.d). Nomeadamente, Virent, Gevo e Avantium foram selecionadas pela Coca Cola Company, a maior empresa de bebidas do mundo, para fornecer em escala global sua bio-PET chamada Plantbottle® (Coca-Cola Journey, 2011).
Com relação às análises quantitativas aplicadas pelo IFBB, destaca-se que as projeções a respeito da capacidade produtiva de bioplásticos foram estimadas por meio de regressões logísticas, as quais consideraram variáveis correspondentes à produção já estabelecida e, inclusive, à capacidade produtiva planejada pelas empresas produtoras de bioplásticos. Quanto ao cálculo e a estimação do tamanho do mercado mundial de bioplásticos, além da capacidade produtiva, foram consideradas ponderações referentes à proporção dos tipos de bioplásticos na produção de cada empresa, bem como seus respectivos preços médios1. Neste estudo, os valores correspondentes ao tamanho desse mercado foram convertidos de Euro para Dólar conforme taxa de câmbio vigente na data da publicação dos dados.
4 APRESENTAÇÃO DOS DADOS, ANÁLISE E RESULTADOS
A produção mundial de bioplásticos foi marcada nos últimos anos por fortes taxas de crescimento. Com o avanço tecnológico, a diversificação dos tipos de compostos e aplicações permitiu que os bioplásticos entrassem definitivamente na cadeia produtiva de várias indústrias. Ademais, políticas pró-sustentabilidade tem incentivado a maior participação dos bioplásticos nos mercados de muitos países. Nesse contexto, Shen, Haufe e Patel (2009) mencionaram que muitas empresas produtoras de bioplásticos passaram a apresentar taxas de crescimento superiores a 50% ao ano. Foi justamente a agregação desses dados empresariais pelo IFBB que possibilitou as análises a seguir.
A Figura 4 apresenta a capacidade produtiva mundial de bioplásticos, incluindo a projeção para os anos posteriores a 2014. Conforme esses dados, a capacidade instalada nas empresas deve mais que quadriplicar, saltando de 1,7 milhão de toneladas, em 2014, para 7,85 milhões de toneladas, em 2019. É estimado que esse crescimento seja impulsionado, principalmente, pela capacidade de produzir bioplásticos duráveis, cuja proporção no total produzido deve passar de 60,9%, em 2014, para algo em torno de 83%, em 2019.
Figura 4. Capacidade produtiva mundial de bioplásticos (2014-2019).
Fonte: Elaboração própria com dados do Institute for Bioplastics and Biocomposites (n.d.). Biopolymer platform (base de dados). Recuperado de http://ifbb.wp.hs-hannover.de/downloads/index.php?site=Statistics&nav=2-0-0-0-0
Grande parte da produção mundial de bioplásticos tem sido destinada à fabricação de embalagens rígidas. Essas embalagens são comuns em itens de limpeza, cuidados pessoais, utensílios domésticos, brinquedos, alimentos, agroquímicos, dentre outros produtos. A massa com essa destinação deve passar de 790 mil toneladas, em 2014, para quase 6 milhões de toneladas, em 2019, um crescimento de mais de seis vezes a produção de 2014. A seguir, a Tabela 1 mostra a massa de bioplásticos destinada a cada segmento produtivo em 2014 e a projeção para 2019.
Tabela 1.
Capacidade produtiva mundial conforme destinação (em 1.000 Toneladas).
Segmentos produtivos |
2014 |
2019 |
Crescimento |
Embalagens rígidas |
790 |
5.875 |
644% |
Embalagens flexíveis |
359 |
587 |
64% |
Têxtil |
186 |
560 |
201% |
Bens de consumo |
126 |
378 |
200% |
Agricultura e horticultura |
107 |
208 |
94% |
Automotivo e transporte |
94 |
184 |
96% |
Construção |
20 |
22 |
10% |
Eletroeletrônicos |
6,7 |
21 |
213% |
Outros |
7,6 |
10 |
32% |
Fonte: Elaboração própria com dados do Institute for Bioplastics and Biocomposites (n.d.). Biopolymer platform (base de dados). Recuperado de http://ifbb.wp.hs-hannover.de/downloads/index.php?site=Statistics&nav=2-0-0-0-0
A Figura 5 mostra como deve evoluir a distribuição da capacidade produtiva referente aos bioplásticos entre os continentes do globo. O maior investimento em capacidade produtiva desses materiais ocorre na Ásia devido ao melhor acesso às matérias-primas, bem como um quadro de políticas favoráveis ao desenvolvimento da produção, como argumentam Aeschelmann e Carus (2015) e OCDE (2013). A participação na capacidade produtiva mundial correspondente à Ásia deverá aumentar de 58,1%, em 2014, para 80,6%, em 2019. Por outro lado, aquela da América do Norte deverá cair de 14% para 4,9%, enquanto a da Europa também deverá passar de 15,4% para 4,1% nesse período. Quanto à Europa, Philp et al. (2012) ressalta que a restrição aos produtos geneticamente modificados pode dificultar o aprimoramento do processo produtivo de bioplásticos. É provável que a participação relativa da capacidade produtiva instalada na América do Sul se mantenha próxima da atual, passando de 12% para 10%, mesmo considerando um crescimento absoluto da bioeconomia neste continente. A participação da capacidade produtiva existente na Oceania, que correspondia a 0,5%, em 2014, deverá reduzir-se a apenas 0,1% do total global. A Figura 5 ilustra a participação dos continentes na capacidade produtiva global de bioplásticos referente à 2014, bem como as projeções para 2019.
Figura 5. Distribuição da capacidade produtiva de bioplásticos conforme os continentes em 2014 e previsão para 2019.
Fonte: Elaboração própria com dados do Institute for Bioplastics and Biocomposites (n.d.). Biopolymer platform (base de dados). Recuperado de http://ifbb.wp.hs-hannover.de/downloads/index.php?site=Statistics&nav=2-0-0-0-0
O IFBB (n.d) também calculou o valor correspondente ao tamanho do mercado mundial de bioplásticos até 2014, bem como realizou uma projeção para o período que vai desse ano até 2018. Os resultados são mostrados no Gráfico 5. Conforme essa projeção, o tamanho desse mercado deve passar de um pouco mais de US$7 bilhões, em 2014, para US$20 bilhões, em 2018, o que equivale a quase triplicar o valor gerado na produção. A Figura 6 ilustra esse crescimento esperado.
Figura 6. Mercado mundial de bioplásticos (2012-2018).
Fonte: Elaboração própria com dados do Institute for Bioplastics and Biocomposites (n.d.). Biopolymer platform (base de dados). Recuperado de http://ifbb.wp.hs-hannover.de/downloads/index.php?site=Statistics&nav=2-0-0-0-0
Nos próximos anos mudanças significativas devem ocorrer na participação dos continentes no mercado mundial de bioplásticos (Figura 6). A projeção indica expansão do valor produzido na Ásia, que deve ter sua participação aumentada de 34% do mercado mundial, em 2012, para 44,7%, em 2017. A participação nesse mercado correspondente à América do Sul deve saltar de 17,5% para algo por volta de 36% nesse período. Ao contrário, a participação dos outros continentes no mercado mundial deverá diminuir entre 2012 e 2017: a participação da Europa deve baixar de 35,6% para 14,3%, no caso da América do Norte deve reduzir de 12% para 4,7% e, por fim, a participação da Oceania deve cair de 0,4% para algo um pouco menor como 0,3% do mercado.
Figura 7. Participação dos continentes no mercado mundial de bioplásticos em 2012 e previsão para 2017.
Fonte: Elaboração própria com dados do Institute for Bioplastics and Biocomposites (n.d.). Biopolymer platform (base de dados). Recuperado de http://ifbb.wp.hs-hannover.de/downloads/index.php?site=Statistics&nav=2-0-0-0-0
Observando tanto os dados de capacidade produtiva quanto aqueles de tamanho do mercado, nota-se que a indústria de bioplásticos expandir-se-á de maneira intensa, sobretudo, na Ásia e América do Sul. Aeschelmann e Carus (2015), Janssen e Rutz (2011), bem como OCDE (2013) defendem que o destaque desses continentes se deve às vantagens comparativas que eles apresentam, tais como disponibilidade de terras férteis para a produção da biomassa e um quadro de normatizações favoráveis. Cabe destacar que o crescimento da produção de bioplásticos deve ser impulsionada pela utilização dos compostos duráveis em embalagens rígidas. Em consonância com o que é descrito pela literatura, mais do que apenas o crescimento de uma atividade produtiva, a ascensão dos bioplásticos deve seguir uma lógica de produção e consumo sustentável, trazendo benefícios ambientais e socioeconômicos.
5 CONCLUSÃO
Este estudo partiu da atribuição de uma definição para bioplásticos conforme as principais características desses materiais. Com embasamento em European Bioplastics (2016), Hogan et al. (2015) e Lackner (2015), os bioplásticos foram definidos como plásticos de base biológica ou biodegradáveis e, sobretudo, aqueles que apresentam ambas as características.
Em seguida, foi explicado porque esses materiais contribuem para o avanço em direção a uma sociedade mais sustentável. Destacando-se em relação a outras atividades produtivas mesmo no âmbito da bioeconomia, os bioplásticos geram importantes benefícios não só relacionados à sustentabilidade ambiental, mas também em relação aos aspectos socioeconômicos. Alguns desses benefícios são reduzir a emissão dos gases que causam o efeito estufa, oferecer melhores opções de destinação final dos resíduos sólidos, reduzir a dependência do petróleo e apresentar relativamente maior geração de empregos que outras atividades produtivas.
Por fim, foram analisados os dados sobre o mercado global de bioplásticos. Esses dados projetam um forte crescimento da capacidade produtiva e do tamanho do mercado em termos de valor produzido. Enquanto a capacidade produtiva deverá ser multiplicada por mais de quatro vezes de 2014 até 2019, o valor referente ao tamanho do mercado deve chegar em 2018 a quase três vezes o valor registrado em 2014. Nesse sentido, o mercado de bioplásticos provavelmente entrará em uma fase de crescimento acelerado, impulsionado, principalmente, pela produção de compostos duráveis, direcionados para a produção de embalagens rígidas.
Também é importante notar como esse mercado deverá estar distribuído entre os continentes do globo. Ásia e América do Sul devem ter uma maior expansão das atividades produtivas de bioplásticos, uma vez que apresentam vantagens comparativas em relação aos outros continentes.
Tendo em vista esse quadro, é provável que o Brasil acomode a maior parte do crescimento do mercado sul-americano, pois, além de apresentar uma grande disponibilidade de terras férteis, reúne algumas das maiores empresas produtoras de bioplásticos do mundo, as quais têm investido em pesquisa e desenvolvimento para aprimorar o processo produtivo desses materiais. Assim, deixa-se como indicação para trabalhos futuros investigar o desenvolvimento da atividade produtiva de bioplásticos nesse país.
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1 Para mais, ver a metodologia da Biopolymer Platform do IFBB (n.d).