A DIMENSÃO AMBIENTAL DA SUSTENTABILIDADE EM PAUTA NO SETOR DE BOVINOCULTURA DE CORTE: ANÁLISE DOS DIÁLOGOS ENTRE STAKEHOLDERS SUL-MATO-GROSSENSES
Dario de Oliveira Lima Filho
Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Brasil
[email protected]
Denise de Barros Azevedo*
Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Brasil
[email protected]
Maisa Gomide Teixeira
Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Brasil
[email protected]
Eronildo Barbosa da Silva
Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Brasil
[email protected]
RESUMO
O objetivo deste artigo é analisar os diálogos entre stakeholders da cadeia produtiva de bovinocultura de corte em torno do tema sustentabilidade. Busca-se perceber quais questões a este respeito estão surgindo nos diálogos e, mais especificamente, objetiva analisar como o tópico de mudanças climáticas se apresenta. Justifica-se o estudo pela contribuição que os diálogos entre estes stakeholders podem ofertar para a definição de novos caminhos para lidar com os dilemas que se apresentam com a necessidade de se reportar às mudanças climáticas na pecuária bovina de corte. O tema é analisado baseando-se nas teorias de Stakeholders, mais especificamente de diálogos entre stakeholders e no conhecimento sobre Sustentabilidade e Mudanças Climáticas. Foi realizada uma pesquisa de campo, por meio de entrevistas com representantes das organizações do Sistema Agroindustrial da Carne Bovina do Mato Grosso do Sul, um dos Estados brasileiros mais importantes deste setor. Realizaram-se análise documental de relatórios, artigos, livros e portais na web, e análise de conteúdo com o material das entrevistas. Como resultado, percebe-se que os diálogos se efetivam muito mais no campo produtivo técnico, envolvendo temas como genética industrial, leis ambientais, financiamentos, sanidade animal, preço da carne, entre outros assuntos, do que em torno das mudanças climáticas. Verificou-se baixa frequência de diálogos e a existência de assimetria, o que indica ausência de sinalização sistemática voltada para informar e formar os elos entre os agentes em toda a extensão da cadeia.
Palavras-chave: Sustentabilidade; Diálogos entre stakeholders; Sistema Agroindustrial; Bovinocultura de corte; mudanças climáticas.
THE ENVIRONMENTAL SUSTAINABILITY DIMENSION IN THE AGENDA OF THE BEEF CATTLE SECTOR: ANALYSIS OF THE DIALOGUES BETWEEN STAKEHOLDERS FROM MATO GROSSO DO SUL
ABSTRACT
This paper aims to analyze the dialogues between stakeholders in the cattle production chain around the theme of sustainability. We propose to apprehend which issues on this respect are arising in the dialogues and, more speficificaly, the study’s objective is to analyze how the topic of climate change is being presented. This effort is justified given that the dialogue between these stakeholders can help define new paths to deal with the dilemma that appears with the necessity of reporting to climate change in the beef cattle sector. To analyze this issue our study was based on the theory Agribusiness Systems, Stakeholder theory, specifically about the dialogue between stakeholders, and knowledge produced on Sustainability and Climate Change. A field research was performed through in-depth interviews, with representatives of organizations from the Beef Agroindustrial System of Mato Grosso do Sul, one of the most important states for Brazilian beef cattle. We conducted documental gathering and analysis of reports, papers, books, and web sites as well as content analysis with the material from interviews. As a result, we can infer that the dialogues are being accomplished much more in the technical-productive field, involving topics such as new pastures, industrial genetics, environmental laws, funding, animal health, meat prices, among other issues directly related to product activities, more than about climate change. Moreover, we observed a very low frequency of dialogues and the existence of asymmetry in the chain, which indicates that there is no systematic signaling directed to inform and form links between agents throughout the chain extension.
Keywords: Sustainability; Dialogues between Stakeholders; Agroindustrial system; Beef Cattle; Climate change.
LA DIMENSIÓN DE SOSTENIBILIDAD AMBIENTAL EN LA AGENDA DEL SECTOR DE GANADO VACUNO: ANÁLISIS DEL DIÁLOGO ENTRE LOS GRUPOS DE INTERÉS DE MATO GROSSO DO SUL
RESUMEN
El objetivo de este trabajo es analizar el diálogo entre los grupos de interés de la cadena de producción de la carne de ganado en torno a la cuestión de la sostenibilidad. Buscamos entender que problemas en este sentido están surgiendo en los diálogos y más concretamente, el objetivo es analizar cómo el tema del cambio climático se apresenta. El estudio se justifica por el hecho de que el diálogo entre estos actores puede contribuir para identificar nuevas formas de lidiar con los dilemas que surgen con la necesidad de reportar al cambio climático en el ganado vacuno. El tema se analiza sobre la base de las teorías de los sistemas agroindustriales, de las partes interesadas, especialmente el diálogo entre las partes interesadas y los conocimientos sobre la sostenibilidad e el cambio climático. Un estudio de campo se llevó a cabo, a través de entrevistas en profundidad con los representantes de las organizaciones de el sistema agroindustrial de la carne de vaca en el estado de Mato Grosso do Sul, uno de los estados más importantes para la carne de res brasileña. Se fue llevado a cabo una análisis documental en artículos, libros, informes y portales de la web y análisis de contenido con material de la entrevista. En consecuencia, se dio cuenta de que los diálogos son mucho más productivos en el campo técnico, involucrando temas como la nueva pastura, genética industriales, las leyes ambientales, la financiación, la salud animal, precios de la carne, entre otras cuestiones directamente relacionadas con las actividades con el producto mucho más que en el dominio del cambio climático. Se observó una baja frecuencia de los diálogos y existencia de asimetría, lo que indica la ausencia de señalización sistemática para informar y formar a los vínculos entre los agentes en toda la extensión de la cadena.
Palabras clave: Sostenibilidad; Diálogo entre las partes interesadas; Sistema Agroindustrial; Ganado vacuno; Cambio climático.
O presente artigo possui o objetivo de identificar como ocorrem os diálogos entre os stakeholders do setor de bovinocultura de corte diante da emergência do tema da sustentabilidade e das mudanças climáticas e qual a sua influência para a consolidação desta cadeia produtiva sul-mato-grossense no agronegócio brasileiro. A motivação por trás deste propósito reside no fato de se saber que a opinião pública e a mídia têm desferido críticas sobre as formas como o homem moderno está produzindo os bens materiais de que precisa para a sua reprodução. A mobilização de segmentos da sociedade em prol da sustentabilidade reflete uma tendência que se tornou forte o suficiente para não poder mais ser menosprezada pelas organizações. Nesse sentido, a mudança torna-se fundamental para que o debate em torno da crise ambiental seja transformado em resoluções específicas e ajude as cadeias produtivas agroindustriais, em especial a da bovinocultura de corte, a se adequar ao novo padrão de atividades que vem se delineando.
O Agronegócio tem uma participação significativa na economia do país representando, em 2013, aproximadamente 21,5% do Produto Interno Bruto - PIB (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento - MAPA/AGE, 2013). Atualmente, o agronegócio possui, também, grande contribuição no saldo da balança comercial brasileira e apresenta uma posição de destaque na produção agroindustrial mundial.
O conceito de agribusiness ou agronegócio mais difundido foi cunhado por Davis e Golberg (1957) como a soma total das operações de produção e de distribuição de suprimentos agrícolas, das operações de produção nas unidades agrícolas, do armazenamento, do processamento e da distribuição de produtos agrícolas e itens produzidos a partir deles. Essa visão sistêmica do conceito de Agronegócio - entendido como uma sequência de operações interdependentes no processo de produção, modificação e de distribuição do produto ao consumidor final – recebeu a denominação de Commodity System Approach, ou sistema agroindustrial de commodities. Tal abordagem estaria fortemente pautada na exigência de coordenação das redes de empresas interdependentes na cadeia de produção. Coordenação esta que é imprescindível para que um país como o Brasil se reporte ao desafio de crescer em mercados de maior valor sem abrir mão da liderança em diversos segmentos de commodities.
Com relação à carne bovina - commodity, na qual recai o foco do presente estudo - a sua venda, como a de qualquer commodity, é marcada por muitas disputas. O debate sobre mudanças climáticas insere-se em meio a essas questões contenciosas. Frequentemente, instrumentos institucionais são utilizados para restringir a transação de mercadorias dos outros países, isto é, barreiras artificiais são criadas para dificultar que determinado país tenha sucesso em suas vantagens comparativas. Por conseguinte, parte das críticas direcionadas às commodities produzidas no Brasil pode estar fundada em disputas econômicas (Berndt, 2010). Por outro lado, as restrições institucionais representam pressões sociais por novos padrões de atividade comercial. Cabe, portanto, aos setores se articularem de modo a elevar sua competitividade.
O fato de a atividade bovina se valer de atividades de desflorestamento para criar pastagens tem gerado muita reação por parte da mídia popular interna e externa. O tema ganhou tanto relevo que os frigoríficos, as redes de supermercados e o Ministério Público resolveram agir conjuntamente para combater as práticas nocivas ao meio ambiente. Todavia, o processo antrópico não se materializa apenas na derrubada de florestas para o plantio de pastagens. Entre as denúncias de atos praticados por parte dos produtores, constam trabalho escravo, desmatamento ilegal e apropriação de terras de quilombolas e de outras comunidades tradicionais (Barreto, Pereira & Arima, 2008). Ademais, sabe-se menos a respeito, mas a produção de pecuária bovina, isto é - o processo de cria, recria, engorda e abate da criação bovina - tem sido acusada de oferecer relativa contribuição para as mudanças climáticas. O núcleo da crítica é que a bovinocultura produz gás metano e outros influentes no processo de aquecimento global. A produção desse gás acontece na ruminação do bovino, ou seja, na fermentação dos alimentos que se realiza no aparelho digestivo dos herbívoros. Os ruminantes globais produzem de 80 a 103 milhões de toneladas de metano por ano, o que equivale a 25% do metano produzido pela humanidade (Berndt, 2010).
Assim, a pesquisa sobre a participação dos stakeholders nos processos de mudança em prol da conservação ambiental pode revelar oportunidades para a ampliação dos diálogos e a criação de novas tecnologias e teorias que se reportem a esse problema. Defende-se que o melhor entendimento sobre os diálogos entre os stakeholders da cadeia da bovinocultura de corte, notadamente relacionados à dimensão ambiental, pode ajudar na definição de novos caminhos para o dilema das mudanças climáticas relacionadas ao setor.
O artigo está estruturado de forma a possibilitar que o leitor se inteire sobre a relação da cadeia produtiva de bovinocultura de corte com as mudanças climáticas. As teorias sobre stakeholders e o conhecimento produzido sobre o diálogo entre esses atores são também apresentadas. Em seguida, a seção dos métodos informa o caminho percorrido pela investigação. Os resultados estão dispostos na seção de análise, após a qual se discorre sobre as conclusões do estudo, suas implicações para o setor em análise, suas limitações e as recomendações para novas pesquisas.
Esta seção busca apresentar os principais elementos que fornecem suporte teórico para o estudo. Estes serão posteriormente analisados a partir dos dados empíricos. As discussões centrais referem-se ao objeto de aplicação empírica, o Sistema Agroindustrial ou cadeia da bovinocultura de corte, aos diálogos entre os stakeholders e à mudança climática.
O termo sistema agroindustrial (SAG) remete a uma visão ampliada da cadeia produtiva agroalimentar. Esse sistema, no caso da bovinocultura de corte, está organizado em torno de agentes econômicos que controlam a produção, processamento e comercialização antes e depois da porteira. O SAG engloba todas as fases da cadeia sinalizando com as suas regras institucionais e culturais os caminhos que os atores da cadeia devem seguir para oferecer aos consumidores produtos com garantia de origem. Os stakeholders localizados em partes diferentes do planeta estão ligados pelas regras e metas que embasam o SAG.
De acordo com Machado (2000), o SAG abrange um processo de práticas sistemáticas de segregação física e troca de informações entre diferentes agentes da cadeia produtiva, responsáveis pela execução e cumprimento de uma meta especificada: preservar os atributos e a identidade de produtos transacionados segundo suas especificações. O SAG contempla as regras que ancoram as relações econômicas entre os agentes. São as leis, normas, cultura, enfim, aquilo que organiza, por meio de regras, as relações na cadeia.
O processo de criação de relações coordenadas com os agentes do SAG é fundamental para que a cadeia produtiva fique bem posicionada no mercado. De acordo com Batalha (2001), é cada vez mais claro para a comunidade acadêmica e empresarial que o crescimento da competitividade do agronegócio brasileiro depende da diminuição das práticas concorrentes entre os agentes das cadeias, bem como destes com os agentes governamentais. Logo, o debate entre esses agentes por meio de um diálogo saudável pode sinalizar um passo nesta direção.
Como foi dito antes, a disputa que se efetiva no mundo comercial tem criado algumas dificuldades para o SAG da carne bovina brasileira. As grandes corporações que disputam o mercado mundial exercem pressão para a criação de empecilhos tais como as barreiras sanitárias, medida de proteção muito utilizada no comércio internacional (Thorstensen, Ramos, Muller & Baptista, 2013). Porém, em que pesem essas dificuldades, a conjuntura mundial é favorável para o SAG nacional da bovinocultura de corte. O desenvolvimento no Brasil de práticas de inseminação artificial, confinamento, uso de novas forrageiras, ferramentas de gestão, tecnologia para abate e processamento, controle sanitário e ambiental, tem ajudado muito (Buainain & Batalha, 2007). Por outro lado, problemas de infraestrutura são limitantes.
Uma das ameaças ao crescimento das exportações são os problemas de infraestrutura portuária que o Brasil ainda enfrenta. Ademais, conforme Lourenço (2009), as estradas brasileiras, por onde escoa a maior parte dos produtos agropecuários, são um fator crítico para o posicionamento competitivo do agronegócio brasileiro no mercado mundial. Dados de 2007 disponíveis no Plano Nacional de Logística e Transportes (PNLT) ressaltam que 58% do transporte de cargas do agronegócio brasileiro é realizado pelo modal rodoviário e as regiões com maior expressividade no abastecimento do agronegócio ficam distantes das regiões portuárias do sul e sudeste. Essa situação agrava-se pelo estado precário de conservação da malha rodoviária que onera ainda mais os custos de transporte (Lourenço, 2009).
O resumo esquemático do SAG da carne bovina pode ser visualizado na Figura 1.
Figura 1. O Sistema Agroindustrial (SAG) da Bovinocultura de Corte.
Fonte: Buainain, A. M., & Batalha, M. O (Coords.). (2007). Cadeia produtiva da carne bovina (Vol. 8). Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), Secretaria de Política Agrícola (SPA), Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA), Brasília, Brasil.
Como mostra o esquema ilustrativo, o consumidor é timoneiro na cadeia de bovinocultura de corte. As suas prioridades relativas aos critérios de compra servem de parâmetro para o que a cadeia produtiva deve seguir. O mercado de proteína animal depende da opinião do consumidor e, este, de acordo com Lima-Filho, Sprosser e Novaes (2003) e Novaes, Sproesser, Lima-Filho e Figueiredo (2005), está preocupado com as mudanças climáticas e quer saber como a carne que consome é produzida. Argumenta-se, portanto, que o acesso à informação ao longo do SAG é de fundamental importância, o que aponta para a necessidade de ampliação do diálogo.
As pesquisas indicam que mudanças climáticas globais estão ocorrendo no planeta. Nos últimos ١٠٠ a ١٥٠ anos, o ritmo em que a temperatura começou a subir está muito maior do que ocorria naturalmente até então. Conforme Nobre (2012), há consenso nessa questão entre os estudiosos do assunto. Os cientistas considerados céticos e que promovem dúvidas a este respeito, de acordo com o autor, estariam sendo financiados por lobbies de empresas que possuem interesse contrário ao alerta que está sendo emitido. Entre os que defendem que as evidências são irrefutáveis, o que se discute são as origens, a intensidade e as implicações dessas mudanças, em termos dos aspectos que serão influenciados e dos prazos para que sejam sentidos os seus impactos. Cientistas reunidos sob a liderança do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), em 2007, como também no Seminário Internacional de Mudanças Climáticas, organizado pelo Instituto Nacional de Pesquisas e Defesa do Meio Ambiente (INPE), em 2010, alertaram os governos que a temperatura do planeta deve subir até o final do século. Acredita-se que fique em torno de 3°C a mais que a do período pré-industrial. Essa alteração pode gerar impactos na saúde humana, nos ecossistemas, na segurança alimentar, na economia, nos recursos hídricos e na infraestrutura física do planeta (Nobre, 2012).
Conforme Berndt (2010) e Berndt e Tomkins (2013), a bovinocultura estaria oferecendo relativa contribuição para as mudanças climáticas, com a produção de gás metano. Contudo, no que tange ao impacto da bovinocultura de corte, há indícios de que é possível mitigar os efeitos negativos do processo de cria, recria e engorda da pecuária bovina. Apesar de estudos científicos sobre o assunto ainda estarem em processo, algumas medidas como melhoria nutricional, adubação de pastagens, melhoramento genético, antecipação da idade para primeira cobertura, diminuição da idade para abate, entre outras, são sugeridas para reduzir as emissões de metano (Franco & Ribeiro, 2008; Brandão, Ceolin, Ruviaro, Gianezini & Dias, 2012; Neves, 2012).
Segundo Neely, Bunning e Wilkes (2009), boas práticas de manejo podem tornar a atividade pecuária mitigadora de gases de efeito estufa e apoiar a adaptação do setor à orientação sustentável. Em primeiro lugar, reverter a degradação da terra através de um melhor manejo do pasto e pastagens poderia contribuir para restaurar índices de carbono do solo e, ao mesmo tempo, melhorar a subsistência baseada na pecuária. Neste sentido, passa-se a reconhecer o potencial que as áreas de pastagens possuem para o sequestro de carbono. Além do mais, a utilização de biodigestores para redução da eliminação dos gases de efeito estufa pela fermentação entérica e os sistemas de criação em confinamento representam oportunidades para uma maior conformidade com a agenda do desenvolvimento sustentável.
Práticas de manejo animal são, também, importantes instrumentos, uma vez que o melhoramento genético está evoluindo muito, e pode propiciar, por exemplo, antecipação da idade para a primeira cobertura, assim como diminuição da idade do abate para evitar uma alta liberação de gás metano na atmosfera (Berndt & Tomkins, 2013; Monteiro, 2009; Grainger & Beauchemin, 2011). Estas tecnologias podem ser desenvolvidas para amenizar o efeito estufa sem gerar problemas de bem-estar animal. Em suporte à adoção destas tecnologias, Brandão, Ceolin, Ruviaro, Gianezini e Dias (2012) citam a criação de certificados de sistemas de produção.
No entanto, tais práticas precisam chegar a todos os integrantes da cadeia produtiva da pecuária bovina de corte. Em particular, pelo papel que cumprem na rede, os que estão a montante – o pecuarista – são os que mais carecem deste tipo de informação. É ele, inicialmente, quem lida mais diretamente com a produção de bovino, porém, por questões culturais e de oportunidade, não é o mais informado da cadeia (Ceolin, 2011). Desta forma, de acordo com Buainain e Batalha (2007, p.59), “a difusão de tecnologia para as diferentes organizações com acesso limitado a tecnologias de gestão” apresenta-se como um desafio a ser enfrentado.
Assim, os problemas que despontam na atualidade exigem cada vez mais diálogos entre os stakeholders para serem resolvidos. A rede que estabelece simetria nos diálogos tem condições de superar os desafios que estão postos, sejam de origem natural, sejam oriundos de iniciativas que se gestam no mercado.
A Ciência Baseada em Diálogos com Stakeholders, segundo Welp, Vega-Leinert, Stoll-Kleemann e Fürstenau (2006) e Welp e Stoll-Kleemann (2006), constitui-se de estruturas de processo de comunicação, que integram os pesquisadores com os stakeholders. Os stakeholders possuem o conhecimento necessário para ajudar os pesquisadores a compreender, representar e analisar os problemas das mudanças globais ambientais. Assim, pode-se ampliar a rede de comunicação com tomadores de decisões e gestores de modo a fornecer subsídios para eles efetuarem mudanças.
Hart e Milstein (2004) defendem que a realização de uma forma mais inclusiva de capitalismo, caracterizada por um diálogo e uma colaboração de duas vias com os stakeholders anteriormente desprezados ou ignorados pelas empresas (por exemplo, o pequeno-médio pecuarista) pode ajudar na criação de mapas comuns para os negócios de amanhã. Assim, uma visão de sustentabilidade que facilite a imaginação competitiva por meio destes mapas pode fornecer um guia para os empresários em termos de prioridades organizacionais, desenvolvimento de tecnologia, alocação de recursos e planejamento de modelos de negócio (Hart & Milstein, 2004).
O conceito de stakeholders permite entender a cadeia em estudo em toda a sua extensão e complexidade, o que é importante, pois aponta para uma noção ampla e plural; isso é importante em função da pluralidade e complexidade do tema. Além disso, Azevedo (2010) menciona que o foco nos diálogos entre stakeholders permite uma análise pregressa, pois antes de se pensar em estratégia, volta-se ao foco do problema, permitindo conhecer o histórico e interesses dos stakeholders participantes do problema em questão e, ao mesmo tempo, olhar para o desenvolvimento de alternativas. Em termos organizacionais, Campos (2010) propõe que dialogar nada mais é senão empenhar-se na execução e concretização dos objetivos propostos pela própria organização. Sem a habilidade do diálogo não haveria como gerir pessoas de modo a alcançar resultados satisfatórios (Campos, 2010).
Quando se propõe estudar diálogos em redes, percebe-se a superioridade das redes de grupos de resolução de problemas em relação às habilidades individuais. Como resultado, as redes emergem como atraentes recursos para que os seus atores possam obter resultados por seus próprios meios e colaborar com outros para combinar as bases dos conhecimentos. Isto é uma importante consequência da formação de rede em diálogos de stakeholders, a habilidade de tratar os problemas complexos ambientais (Welp & Stoll-Kleemann, 2006).
Neste sentido, vale ressaltar que, onde existe diálogo é porque algum tipo de conflito está envolvido (Azevedo, 2010). Nesse trabalho, a ideia de conflito é retratada como algo positivo em que as partes expõem seus pontos de vista, são expostos a outras opções, melhoram a capacidade de tomar decisões e melhoram os relacionamentos e o respeito pelas diferenças (Nascimento & Sayed, 2002). Contudo, como sugerem Paula e Martinelli (2005), o conflito pode ter efeitos positivos e negativos. Conforme Martinelli et al. (2003, p.7), os efeitos negativos ocorrem quando “as partes desviam suas forças, desperdiçam tempo com discussões sem relevância e atrapalham ainda mais a comunicação, escondendo informações ao invés de compartilhá-las”.
Em relação aos fins, a pesquisa possui caráter exploratório-descritivo. Este é o caso quando há o intuito conjunto de descrever uma situação com profundidade, buscando dar-lhe realismo por meio de grande quantidade de dados e informações coletadas e de gerar proposições que possam ser exploradas em novas pesquisas (Jóia, 2006). Com relação aos meios, a investigação, de natureza qualitativa, baseou-se em pesquisa documental e de campo. Realizou-se levantamento e análise documental de relatórios, artigos, livros e portais na web. Uma pesquisa de campo também foi conduzida junto a representantes das organizações do Sistema Agroindustrial da Carne Bovina, por meio de entrevista individual em profundidade.
O foco temporal do estudo empírico compreende os anos de 2000 a 2013. A escolha por este intervalo de tempo se deve, principalmente, ao fato de ser este o período de desenvolvimento mais acelerado no estado da cadeia bovina de corte. Pode-se dizer, portanto, que, apesar do emprego de enquete seccional, a pesquisa possui perspectiva longitudinal, ou seja, a coleta de dados é feita em um determinado momento, mas resgata os dados e informações de períodos passados. Vieira (2006, p.21) explica que “os dados resgatados do passado são, normalmente, utilizados para explicar a configuração atual do fenômeno”.
Os dados secundários foram coletados em livros e relatórios dos acervos da Agência Estadual de Defesa Sanitária Animal e Vegetal – Iagro, Secretaria de Estado de Meio Ambiente, do Planejamento, da Ciência e Tecnologia – Semac, Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento – MAPA e da biblioteca da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul - UFMS.
A coleta de dados primários foi realizada no primeiro semestre do ano de 2013. Para a escolha dos entrevistados foi levado em conta o papel que cada técnico ou dirigente cumpre na cadeia produtiva da bovinocultura de corte de Mato Grosso do Sul. A ideia básica era entrevistar atores que conhecessem os problemas e as oportunidades na cadeia, tendo em vista que nem sempre os dirigentes máximos de uma organização são os melhores informantes. Assim, resultou-se em representantes significativos para a pesquisa, especificados na Tabela 1. Cada participante possui um código de modo a resguardar o seu anonimato.
Tabela 1.
Códigos dos Entrevistados
Função na organização | Frequência | Códigos |
Liderança patronal rural | 02 | A e S |
Consultor de empresa | 02 | D e M |
Pecuarista | 05 | J, K, L, N e R. |
Professor universitário e pesquisador (UFMS) | 03 | F, G e O |
Professor universitário e pesquisador (Uniderp) | 01 | H |
Assessora de uma organização patronal | 01 | Q |
Gerente internacional de venda de carne | 01 | B |
Meteorologista e pesquisador | 01 | E |
Gestor público federal na área de fiscalização de carne | 01 | I |
Gestor público federal na área ambiental | 01 | C |
Gestor público estadual na área de fiscalização de carne | 01 | P |
Total | 19 |
Fonte: Elaborado pelo autor com base em dados da pesquisa.
As entrevistas foram realizadas com lideranças laborais dos pecuaristas, produtores rurais, professores, pesquisadores, consultores de empresa, dirigente de empresa frigorífica, varejista especializado e técnicos de sindicatos. Os entrevistados fazem parte do sistema agroindustrial da bovinocultura de corte. Estas tiveram duração média de 60 minutos, foram gravadas em áudio e transcritas e os dados tratados com o apoio do software Sphinx. A análise dos dados foi realizada com base na técnica de Análise de conteúdo descrita por Bardin (2011).
Este tópico objetiva identificar como se materializam os diálogos entre os stakeholders da cadeia produtiva da bovinocultura de corte diante das mudanças climáticas. Esse esclarecimento é de muita relevância em razão do parâmetro que se forma para que as lideranças do SAG estabeleçam estratégias que permitam disseminar entre os atores mais informações.
Embora nem todos se manifestem claramente a favor da possibilidade de a pecuária bovina influenciar negativamente o meio ambiente, esse receio está posto na cadeia. Há um contraste entre os pecuaristas mais avançados e comprometidos com o ambiente natural e os mais claudicantes, que afirmam, sem muito embasamento, que não existe mudança climática como decorrência da ação da pecuária bovina. Os relatos a seguir expressam o que dizem os stakeholders quando indagados sobre a forma como a sustentabilidade é abordada em suas propriedades e a relação entre a pecuária de corte e as mudanças climáticas:
Quando compramos gado para ser abatido em nosso frigorífico, queremos saber a origem dele. Tem que ter nota fiscal, o fazendeiro tem que ser proprietário do gado, esse gado tem que possuir certificado sanitário, tem que ter todas as vacinas e controle sanitário para poder nos vender. Com isso estamos contribuindo para acabar com a clandestinidade do gado, pois todos sabem que MS tinha uma quantidade de gado no papel e outra no pasto. Vamos exigir, também, um certificado de que o fazendeiro de gado não adote trabalho escravo, trabalho infantil e que os trabalhadores não derrubam a mata para a produção bovina. Com essas ações, pretendemos contribuir e crescer como uma empresa que trabalha com qualidade (Entrevistado B).
Acho importantíssimo porque existe muita conversa que o gado de corte degrada, mas, na verdade, temos que buscar o equilíbrio. Se você andar hoje nessas fazendas na região de Ribas do Rio Pardo, Camapuã-MS, e mesmo nessa parte mais pobre aqui do município de Campo Grande-MS, (...) você irá observar que tem muito pouco solo que está totalmente degradado. Ainda dá para recuperar muita coisa. Eu digo que o produtor rural precisa de assistência técnica. Com uma simples coisinha dava uma melhora para o produtor (Entrevistado L).
O nosso consumidor merece receber um produto com baixo resíduo. Quando você coloca o produtor [rural] como um componente do processo produtivo e, nele, o meio ambiente, o produtor começa a perceber que é possível produzir e vai aprender a produzir com respeito ao consumidor. O consumidor quer um produto com baixo resíduo ambiental. Ele quer diminuir essa pegada de destruição (Entrevistado M).
Com base nestes relatos percebe-se essa questão a partir de diferentes visões dentro da cadeia. Tanto pelo lado do fornecedor, quanto do frigorífico defende-se a incorporação da orientação sustentável nas práticas da cadeia bovinocultora de corte. Toda cadeia produtiva possui seus métodos de diálogos. São eles, nas suas mais diferentes formas, que permitem que os consensos se materializem. Uma constatação é que os diálogos nem sempre ocorrem de forma a permitir que todos se beneficiem. Por isso é importante ampliar o diálogo para incluir e dar voz aos atores que se encontram mais à margem.
Conforme relatado nas entrevistas, pode-se notar que, mesmo que os diálogos não se materializem, necessariamente, no campo das mudanças climáticas, há diálogos entre os agentes sobre a sustentabilidade ambiental. O tema da mudança climática relacionado à pecuária bovina de corte ainda é novo e não é do domínio da maioria dos stakeholders, como se pode notar nos trechos a seguir. Outro aspecto que se verifica é que os diálogos se efetivam muito mais no campo produtivo técnico. Os assuntos mais comuns são novas pastagens, genética industrial, leis ambientais, financiamentos, sanidade animal, preço da carne, entre outros assuntos.
Não. A gente até ministra várias palestras. A gente é requisitado, né, mas, nessa parte de mudanças climáticas, a gente nunca foi solicitado nesse sentido (Entrevistado N).
Na realidade o produtor, hoje, é quem mais preserva o meio ambiente. Porque nós dependemos do meio ambiente para nosso próprio negócio. Concordo que na nossa região de cerrado a gente preserva os 20% obrigatórios e aproveita os 80% da terra que a lei permite. Agora, dizer que estamos fazendo alguma coisa contra o meio ambiente! Não posso falar isso, porque nós seguimos aquilo que a Constituição permite. Nós não contribuímos para as mudanças climáticas por meio da degradação ambiental. Cumprimos as metas. Mas escuto o comentário de que os animais contribuem com até 35% do metano produzido. Só que não é apenas a pecuária. Outros fatores também contribuem (Entrevistado Q).
Existe [o impacto nas mudanças climáticas] porque tem emissões sensíveis de gases que são biológicas e químicas. É claro que quanto mais gado a gente tem, mais terá emissão de gás. (...) Só que, por causa disso, não podemos deixar de comer carne, não é? (Entrevistado B).
Eu acho que é uma somatória de fatores. Mas dizer que a pecuária bovina de corte tem influenciado as mudanças climáticas é muito forte. Eu acredito que tem um viés muito ideológico. Acho que não! (Entrevistado A).
Eu sou um defensor que não! Em minha opinião não! Vocês podem falar o que for, mas em minha opinião não (Entrevistado R).
Com base nas entrevistas e em fontes secundárias não existe uma disposição clara dos stakeholders, principalmente os pecuaristas, para procurar conhecer o fenômeno das mudanças climáticas. Esse assunto os interessa, porém não se trata de uma preocupação imediata. Eles estão envolvidos com as suas atividades do dia a dia. Soma-se a isto o fato de que esse assunto só é tratado em fóruns específicos. Não é fácil para o produtor rural de pequeno e médio porte ter acesso a esses fóruns. Essa oportunidade fica restrita apenas a alguns stakeholders. A temática, na visão da maioria, não está ainda na sua vida concreta. De outro lado, existem problemas culturais que reforçam o isolamento do pecuarista. Todavia, como demonstra o diálogo do produtor J, há exceções nessa forma de comportamento.
Eu estou convencido daquele aspecto que o boi produz metano. Até porque eu sou curioso e conversei muito quando esse assunto veio à tona. Ouvi gente da Embrapa e profissionais especialistas da área e me convenci de que realmente aquelas afirmativas se confirmam. Tanto é verdade que eu tenho dito para colegas da área de pecuária que a gente tem que mudar o sistema que adotamos no sentido de reduzir a permanência do animal até o abate. Temos que encurtar esse período (Entrevistado J).
São vários os canais em que esses diálogos se efetivam. Parte importante desses diálogos é liderada pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária-Geral - Embrapa, Famasul, Iagro, Acrisul, Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil - CNA, sindicatos rurais, governo de Mato Grosso do Sul - MS, prefeituras e empresas privadas. No trecho a seguir, pode-se perceber que o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - Ibama contribui com o diálogo em favor da sustentabilidade.
Nós fazemos “dia de campo” com técnicos para orientar os produtores, cursos de qualificação pelo SENAR que visam orientar também os produtores. Todo produtor é orientado pelo IBAMA para a preservação (Entrevistado Q).
Por meio das locuções dos entrevistados pode-se tomar conhecimento das principais formas de diálogo que se efetivam entre os stakeholders:
A gente disponibilizou 34 anos de dados. Todos os dados da Embrapa estão disponíveis na internet, no site, se você quer saber a série estatística de chuva, temperatura, o sistema é 24 horas. Se existe um evento extremo, ele registra automaticamente (Entrevistado E).
Olha! Existem os extensionistas com o trabalho de extensão rural feito pelos agentes do Estado. Depois, uma informação importante são esses programas rurais de televisão que têm uma penetração alta e, depois, os agentes com dia-de-campo e assistência técnica privada, só que aí pega um número pequeno de produtores (Entrevistado G).
Nós temos o jornal do fazendeiro. Nós temos o programa de televisão que é o caminho da produção e outras informações como boletim informativo, além de reuniões, palestras, principalmente na exposição [Expogrande – Exposição Agropecuária de Campo Grande]. Nós temos muitas palestras técnicas (Entrevistado L).
O que foi mostrado são os instrumentos comumente usados no Mato Grosso do Sul. Entre estes estão: palestras, jornais específicos para o setor, seminários, extensão e cursos, reuniões, dia-de-campo e telefone.
Contudo, há outros mecanismos de diálogos, com alcance mundial, como internet, rádio, televisão, cinema e todas as formas de comunicação moderna, liderada pela grande mídia eletrônica, que pode estar sendo usada para que esses diálogos se materializem na cadeia produtiva da bovinocultura de corte sul-mato-grossense na forma de perspectivas mais promissoras para o setor em termos de sua sustentabilidade.
Como foi dito anteriormente, essa cadeia vivencia muitos conflitos e diálogos a exemplo das demais cadeias produtivas que, naturalmente, crescem em meio às contradições no que se refere aos interesses individuais e coletivos dos atores na cadeia. É o choque de ideias, valores e interesses que alimentam as cadeias produtivas. Por isso, umas são mais simétricas e outras assimétricas, mas, em todas elas são os diálogos que as movem. Este estudo mostra que existem diálogos na cadeia da bovinocultura de MS, mas ainda são insuficientes considerando que essa é uma cadeia que padece de dificuldades técnicas no elo ‘produção rural’. Estas dificuldades poderiam ser amenizadas com maior comunicação em toda a sua extensão.
Os dados desta pesquisa evidenciam que a cadeia da carne bovina em MS, a exemplo da cadeia em nível nacional estudada por Ceolin (2011) e Brandão et al. (2012), tem como principal característica a desigualdade no recebimento de informação. Os elos e as conexões dessa rede não trabalham ajustados objetivando o bem comum da rede. Há disparidade tecnológica e de informação sobre a produção, abate, processamento e comercialização de carne bovina. Nota-se pouca sinalização e simetria na cadeia, o que pode comprometer o repasse de orientação específica sobre práticas sustentáveis que podem contribuir para redimir os gases de efeito estufa
A bibliografia revisada indica que a cadeia produz poucos diálogos entre os elos. Essa disparidade também foi identificada nas entrevistas com os representantes do setor no Estado sul-mato-grossense, como retratado pelo entrevistado F que sintetiza essa situação.
O maior problema da pecuária [bovina] de corte é a falta de união entre as pessoas [...] o capital social que já existe em outros segmentos da pecuária ainda não chegou no segmento da pecuária bovina de corte. Nós já sentimos isso como solução na suinocultura, avicultura e na pecuária de leite (Entrevistado F).
O fato de os diálogos na cadeia ainda serem insuficientes, conforme Brandão et al. (2012), Buanain e Batalha (2007), Wegner, Maciel, Malafaia, Camargo e Maciel (2011) é confirmado pelos depoimentos de parte dos entrevistados. Esta situação gera maior esforço individual dos atores da cadeia e enseja que muita energia seja despendida, o que acarreta prejuízos para toda a rede e para o consumidor. Este último, se houvesse mais simetria, poderia receber produtos mais seguros do ponto de vista sanitário e ambiental e melhores no quesito sabor. Com diálogo, agentes do sistema agroindustrial poderiam obter melhores receitas e trabalhar melhor a fidelização dos consumidores. Esse incremento pode diminuir a perda de espaço da carne bovina sustentável para outros tipos de proteína animal, como vem ocorrendo.
Buainain e Batalha (2007), neste ponto, afirmam que a dificuldade do consumidor de obter dados corretos sobre sanidade do animal, a real procedência da carne que está sendo consumida e os respectivos métodos de produção – se estão de acordo com as normas vigentes no mundo – pode estar afastando cada vez mais consumidores para outros produtos substitutos. Um exemplo disso é a carne de frango, cujo mercado possui menor assimetria da informação, decorrente de maior diálogo, e, consequentemente, possui uma cadeia com maior nível de integração. A declaração do entrevistado D refere-se a isso.
Eu acho que ainda tem, infelizmente, falta de diálogo. Tinha que ter um pouco mais disso dentro de seminários e, de alguma forma, conseguir chamar a atenção dos fornecedores. Infelizmente, ainda acontece aqui em MS, com a pecuária bastante tradicional, o pessoal é muito voltado ‘da porteira para dentro’, para o que está acontecendo lá na fazenda dele, sem olhar ‘da porteira para fora’, qual que é a importância que isso está tomando, qual que é a importância que este tema está abrangendo no mundo. Ele não pode ficar achando que o cliente dele, para quem ele vende o boi, é só o frigorífico, e vai até ali e acabou o assunto. Tem que pensar que o cliente [...], hoje em dia, é o cara que consome carne no mundo inteiro, o cara que está lá na Suécia comprando a carne que vem daqui de MS (Entrevistado D).
O aumento do fluxo de diálogos poderia implicar na ampliação da conformidade do setor de bovinocultura de corte com a proposta sustentável, tendo em vista o potencial de a cadeia se manter competitiva com o compartilhamento das tecnologias limpas e a possibilidade de articulação dos atores em prol de certificações que estimulam ainda mais a adoção de práticas sustentáveis que atuam na mitigação de gases de efeito estufa.
Desta forma, os diálogos ao longo da cadeia, além de significarem um direcionamento para práticas ambientalmente corretas, representam, também, a possibilidade de mais oportunidades para os atores que se situam à margem na rede do SAG da bovinocultura de corte de Mato Grosso do Sul, o que se reflete em ganhos sociais. Além da redução de diferenças e assimetrias, fluxos consistentes de diálogos podem gerar coesão na cadeia produtiva em prol de ações que beneficiam todos os atores da rede de produção de carne bovina. Ganhos de transparência sobre a qualidade e procedência da carne representam iniciativas condizentes com a sustentabilidade na dimensão social.
O diálogo é fundamental para o bom funcionamento das cadeias produtivas, para equidade dos ganhos. Neste sentido, Braga (2010) chama a atenção para o fato de que, quanto maior for o compartilhamento de informações, menor o atrito e maior a coesão social entre os entes da cadeia. Todavia, Ceolin (2011) enfatiza que o mercado de carne bovina é alimentado por informações incompletas e assimétricas tornando-se fundamental a utilização de sinalizações para a sociedade quanto à qualidade do produto. A declaração anterior do entrevistado D toca nessa questão.
Parte dos problemas de assimetria da cadeia pode ser explicada pela baixa capacidade de coordenação. Os elos pouco se entendem. As iniciativas, no geral, se materializam muito mais nas expectativas do lucro de curto prazo. As estratégias objetivando ações solidárias entre os elos da cadeia são insuficientemente estimuladas. Como afirma Macedo (2009), essa situação pode prejudicar a capacidade de mobilização da cadeia para lidar com os desafios estratégicos representados pela necessidade de elevar a produtividade e pelos riscos sanitários, especialmente a febre aftosa. Abaixo, o entrevistado M reforça este ponto comentando sobre a falta de cooperação entre os membros e o relato do entrevistado D complementa este ponto quando ele menciona a necessidade de os atores da cadeia se organizarem em defesa de seus interesses.
Esse é o principal problema. O produtor tem como inimigo o seu vizinho, ele não tem ele como companheiro de negócio, entendeu. Por isso que fica à mercê de qualquer influência ambientalista, trabalhista, socialista, de indústrias perversas... Ele não tem qualidade sozinho, a falta de cooperativismo é o que mata o produtor (Entrevistado M).
Olhe, eu acho que todo mundo pode vir a ser afetado. A gente tem que ter todo mundo que está envolvido em produção agrícola e produção de alimentos tem que começar a se colocar nas próprias regras, definir os próprios limites antes que venha a regulamentação externa [...] se você fica esperando, provavelmente quem não entende vir a fazer as regras, vai ser muito pior. O setor pode ser afetado se não se organizar (Entrevistado D).
O entrevistado D toca em um assunto de extrema relevância para o setor. Ele reconhece a importância de se organizar para formar uma base normativa forte no campo da pecuária de corte. Ou seja, se as normas fossem criadas internamente e o seu cumprimento garantido pelos próprios membros da cadeia, os atores poderiam se prevenir contra uma ordem coercitiva de natureza externa, que poderia contrariar os seus interesses. Este aspecto é enfatizado por Escobar e Vredenburg (2011) quando eles afirmam que isomorfismo normativo em nível de setor emerge de normas criadas no setor como uma forma de prevenção a regulações rigorosas. O relato anterior confirma o posicionamento dos autores de que a estipulação voluntária de regras pode antecipar regulamentos rigorosos que possam colocar em risco a competitividade do setor no Estado.
A inexistência ou o baixo nível de coordenação vertical da cadeia abre espaço para que o oportunismo e a ganância se instalem. Buainain e Batalha (2007) destacam que, apesar de o Brasil ser um player mundial importante no mercado de carne bovina, devido ao seu clima e à qualidade das suas pastagens, além de sua vasta área territorial, a cadeia é conhecida pela falta de cooperação entre os seus diferentes elos. De fato, Wegner, Maciel, Malafaia, Camargo e Maciel (2011) enfatizam que a cadeia da carne bovina é marcada pela coordenação via mercado (mercado spot), governança mostrada em todos os elos – produtores rurais, frigoríficos, atacadistas e varejistas.
A baixa frequência de diálogos e a existência de assimetria na cadeia indica que não há uma sinalização sistemática voltada para informar e formar os elos entre os agentes em toda a extensão da cadeia. As informações dos atores mais bem estruturados da cadeia – frigoríficos e redes varejistas globais – não estão se materializando com a intensidade e frequência necessárias para a cadeia funcionar mais harmonicamente. A socialização das informações não se materializa na velocidade que a cadeia exige e, assim, alguns atores levam vantagem sobre outros em função da assimetria de informação (Ferreira & Antônio Filho, 2010; Marteleto, 2010). Em todos os elos da cadeia há problemas, mas a situação é mais difícil no elo produção rural. O pecuarista, apesar dos avanços nas comunicações, ainda continua agindo de forma isolada. Trabalha com pouca cooperação técnica e apoio institucional e baixo diálogo entre os pares e demais stakeholders. Essa situação enseja que ele tenha baixo nível de informação sobre os avanços que surgem no mercado nacional e internacional da carne bovina.
O baixo nível de informação sobre os aspectos gerais da produção e comercialização do seu rebanho provoca acentuado descompasso entre quem cria o animal e quem processa e comercializa a carne. O pecuarista, por tudo isso, é o menos beneficiado com o lucro obtido na cadeia. Os frigoríficos e o varejo controlam, de certa forma, a taxa de lucro do produtor rural. Os frigoríficos, conforme Buainain (2013), não mantêm relações de parceria com o pecuarista. Tratam-no apenas como uma fonte de commodities considerando geralmente apenas aspectos instrumentais, como o preço do produto.
Pode-se observar no estudo realizado, ademais, a discrepância que existe entre os pecuaristas, fato prejudicial a toda a cadeia. Uma parte deles ainda pratica formas tradicionais de produção, com a alimentação de animais somente a pasto, sendo estes pastos degradados e a sanidade, de modo geral, questionável. Ao lado dessas unidades produtivas mais tradicionais, existem produtores com tecnologia de ponta praticando confinamento ou semiconfinamento, adotando a rastreabilidade e o cruzamento industrial em escala. No momento em que um elo não funciona corretamente, toda a rede pode perder mercado para outros estados ou países fornecedores, como também para outros tipos de proteína. Nesse quadro mundial, onde tudo está conectado em rede e as comunicações acontecem de forma instantânea, o elo da parte de insumos da cadeia e o da produção tem que cumprir uma série de convenções formais, nacionais e internacionais, visando à segurança do seu produto, notadamente na dimensão ambiental; exigências que, em verdade, criam não só oportunidades, mas também desafios.
Não é por outro motivo que a ideia de se buscar parcerias com a sociedade e com o poder público recebeu o maior número de citações dos entrevistados. Pode-se verificar, com base no que manifestaram os produtores rurais, que eles estão dispostos a encontrar alternativas sustentáveis para a sua produção, só que não sabem como proceder e precisam de orientações para implementar novas tecnologias.
Frente a esses novos desafios que o mundo produtivo está criando para a cadeia produtiva da bovinocultura de corte de MS e do Brasil, sem dúvida, os diálogos são fundamentais. É o caminho por meio do qual novos horizontes podem ser abertos para os stakeholders da cadeia. Mesmo porque, conforme argumenta Buainain (2013), no Brasil, se os grandes e os pequenos produtores não somarem seus esforços, não conseguem cumprir suas cotas internacionais de exportação de carne bovina. O comentário do entrevistado reforça essa ideia.
Em que pesem os problemas decorrentes do isolamento em que vive o produtor rural, mesmo assim, pode-se atribuir aos diálogos a solução de tensões na cadeia. Dados históricos demonstram que os conflitos, os diálogos e as mobilizações decorrentes criaram as condições objetivas e subjetivas para o avanço da cadeia sul-mato-grossense. Ao longo do tempo a bovinocultura de corte de Mato Grosso do Sul converteu-o no quarto maior exportador de carne bovina do país.
Historicamente, os stakeholders da cadeia têm criado estruturas políticas e técnicas que permitem efetivar importantes diálogos. A preocupação, ainda no início do Século XX, de aprimorar o rebanho bovino por meio de cruzamento industrial, tendo como âncora a bovinocultura europeia, representou uma iniciativa relevante, criando as bases para que a cadeia do Mato Grosso do Sul se convertesse em uma das mais importantes do mundo (Buainain, 2013). O mesmo pode ser dito com relação à criação pelos pecuaristas, em 1930, da ACRISUL, entidade de representação política e institucional (Figueiredo, 1994) que promove diálogos formais com o Estado brasileiro, prefeituras, com frigoríficos, varejo e com os consumidores.
Na década de 1960, diálogos foram travados com o objetivo de fortalecer a cadeia da carne bovina. As parcerias com o Estado, por meio das suas instituições, como os bancos, instituições de pesquisa (Embrapa, universidades) e as entidades estatais foram alternativas que redundaram em ganhos consideráveis para o campo da pecuária bovina. No caso da produção de baixo carbono, a Embrapa Gado de Corte (com sede em Campo Grande-MS, criada em 1972) e outras organizações estatais têm um papel importante porque aproximam o Estado brasileiro dos produtores e dos demais elos da cadeia. Na prática, materializa o diálogo entre o Estado, os cientistas e a comunidade.
Os diálogos com as instituições de pesquisa que interferem na consolidação da cadeia da pecuária bovina de MS são reconhecidos pelos atores que participaram da presente pesquisa, como um dos entrevistados menciona:
Eu acho assim, como é que o diálogo contribui? Por exemplo, existem pesquisas para quê? Para tentar minimizar essas questões e como é que contribui? Contribui de que forma. Nós temos excelentes instituições, a Embrapa, e várias outras instituições de pesquisa que estão trabalhando no sentido de encontrar pesquisas eficientes para minimizar essas questões. E como vai contribuir? Todas essas pesquisas têm que ter convergência, e trazer as pesquisas para prática, para que sejam aplicadas a campo (Entrevistado A).
Mais tarde, em 1979, com a emancipação política do sul de Mato Grosso, foi criada a Federação de Agricultura e Pecuária de Mato Grosso do Sul – Famasul - que, hoje, congrega 69 sindicatos patronais rurais cuja missão é exatamente estabelecer diálogos com os demais stakeholders da cadeia bovina e com entidades de representação política tanto estatal como privada. No plano nacional, a cadeia também tem a CNA que lidera os diálogos da produção rural com os demais elos e instituições em níveis nacional e internacional.
Mais recentemente, na primeira década do século XXI, em meio aos problemas gerados pelos seguidos surtos de febre aftosa e de falta de chuva, mesmo assim, os diálogos na rede permitiram a construção de um dos mais modernos parques para produção e abate de animais e comercialização de carne bovina do mundo. A construção desse parque industrial, por sua vez, é fonte de alimentação de novos diálogos que impulsionam o crescimento da cadeia.
A exemplo disso, em 2011 aconteceram, provavelmente, as mais fortes e intensas manifestações dos pecuaristas contra a decisão do Grupo JBS de adquirir, com os recursos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social - BNDES, algumas plantas frigoríficas que estavam fechadas ou operando com capacidade ociosa no Mato Grosso do Sul (Alves Neto, 2012). O receio dos pecuaristas era que o JBS passasse a agir no Estado em regime de monopólio ou oligopólio concentrado; iniciativa que, na prática, força os preços da arroba bovina para baixo, porque não sobram outras opções para os produtores venderem seus insumos (Buainain, 2013). Ou seja, isso implica em elevado poder de barganha por parte dos frigoríficos em relação aos produtores rurais.
Apesar das deficiências que impedem maior interação dos elos da cadeia e as dificuldades de uma rede com baixa simetria de informação, como ficou demonstrado nas entrevistas, percebe-se a existência de diálogos propositivos que se encarregam de fazer avançar a cadeia. Estes são os diálogos responsáveis pela formação, implementação e consolidação da cadeia da carne do Mato Grosso do Sul.
O objetivo desta pesquisa foi compreender como os diálogos entre stakeholders, mais especificamente sobre sustentabilidade e mudanças climáticas, estão afetando o sistema agroindustrial da bovinocultura de corte do Mato Grosso do Sul. O tema da mudança climática relacionado à pecuária bovina de corte ainda é novo e não é do domínio da maioria dos stakeholders. De forma geral, os diálogos efetivam-se muito mais no campo produtivo técnico, enfatizando temáticas tais como novas pastagens, genética industrial, leis ambientais, financiamentos, sanidade animal, preço da carne, entre outros assuntos ligados diretamente às atividades individuais do produto.
A pesquisa demonstrou que há baixa frequência de diálogos e a existência de assimetria na cadeia, o que indica que não há uma sinalização sistemática voltada para informar e formar os elos entre os agentes em toda a extensão da cadeia. Assim, a mobilização política comentada por Escobar e Vredenburg (2011) inviabiliza-se e o setor se torna vulnerável à promulgação de regulamentações rigorosas que podem demonstrar-se contrárias aos interesses e à competividade da cadeia sul-mato-grossense de bovinocultura de corte.
Percebeu-se que as informações dos stakeholders mais bem estruturados da cadeia – frigoríficos e redes varejistas globais – não estão se disseminando com a intensidade e frequência necessárias para a cadeia funcionar mais harmonicamente. Assim, o pecuarista, apesar dos avanços nas comunicações, ainda continua agindo de forma isolada, recebendo muito pouca cooperação técnica e apoio institucional. Entretanto, o Estado possui organizações fundamentais que incrementaram o sistema, como a Embrapa e a Federação de Agricultura e Pecuária de Mato Grosso do Sul – Famasul - que, hoje, congrega 69 sindicatos patronais rurais cuja missão é exatamente estabelecer diálogos com os demais stakeholders da cadeia bovina e com entidades de representação política, tanto estatal como privada. Observa-se que os diálogos com estas e outras instituições de pesquisa impactam positivamente a cadeia da pecuária bovina de Mato Grosso do Sul. Ademais, a análise histórica possibilita o entendimento de que os membros da cadeia, ao longo dos anos, têm conseguido alavancar a relevância do setor no Estado, seja pela influência de atores importantes que agem isoladamente seja pela capacidade da cadeia de articulação de seus interesses.
A contribuição deste estudo reside na importância da discussão em nível de gerência e para a criação de políticas públicas. Em nível de gerência, o estudo traz subsídios aos produtores rurais para que possam atuar na gestão de suas propriedades por meio de um planejamento pontuando as questões ambientais e econômicas da sua região. Em termos de políticas públicas, os achados desta pesquisa indicam a necessidade de que órgãos governamentais estimulem as discussões e proponham fóruns de debates com os stakeholders da cadeia de bovinocultura de corte de Mato Grosso do Sul. Em nível teórico-acadêmico, o estudo demonstra-se relevante, pois articula conceitos de stakeholder e sustentabilidade de modo a elevar os mecanismos de diálogo na cadeia. Estes podem, conforme Zollo, Cennamo e Neumann (2013), elevar o grau de engajamento entre os agentes. Ao passo que a pesquisa possibilita clarear o processo de diálogos em torno do tema da sustentabilidade, pode contribuir para que redes mais fortemente estabelecidas possam ser formadas com base nos seus pressupostos. Desta forma, o estudo pode ajudar no desenvolvimento de bens intangíveis e de capacidades dinâmicas, como também contribuir para o aumento de reputação e legitimidade da cadeia.
As limitações da pesquisa foram a pouca disponibilidade dos entrevistados para fornecer dados para a pesquisa e a enquete de pesquisa transversal, com apenas um período de coleta de dados. Vale ressaltar também que, devido às restrições de tempo e de recursos, optou-se por não inserir o segmento consumidor. Este recorte pode ser considerado uma limitação deste estudo que pode ser explorada em pesquisas futuras. Recomenda-se, ademais, que outras pesquisas continuem a avançar em aspectos teóricos e práticos para fornecer subsídios que contribuam para o fortalecimento do setor.
*Autor para correspondência / Author for correspondence / Autor para la correspondencia: Denise Azevedo - Rua Alameda Recanto das Matas, 200, quadra 3 lote 12 . Residencial Damha 2.Campo Grande - MS. CEP79046-000
Data do recebimento do artigo (received): 05/04/2016
Data do aceite de publicação (accepted): 12/12/2016
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