CARCINOMAS DE CÉLULAS ESCAMOSAS E MODALIDADES DE TRATAMENTO EM CÃES

Alex Alves Rodrigues 1

Silvio de Almeida Junior 2

RESUMO:
A oncologia veterinária tem se firmado como uma área voltada ao tratamento de doenças neoplásicas com base em protocolos terapêuticos e cirúrgicos visando à melhora e a qualidade de vida dos pacientes. Dentre os tumores, é possível citar os carcinomas de células escamosas (CCE), prevalentes em pacientes de idade avançada. Sendo assim, o objetivo do seguinte trabalho é avaliar o uso dos tratamentos em tumores de células escamosas em cães. O CCE é uma doença grave que acomete os animais e os seres humanos, por ser estar relacionada à incidência de raios UV incididos pela superfície terrestre, o tratamento dos animais predispostos a tal doença deve ser considerado. As técnicas utilizadas para tratamentos de CCE são a radioterapia, quimioterapia e eletroquimioterapia, sendo estas, de grande efetividade no tratamento deste tipo de tumor.
Palavras-chave: eletroquimioterapia, neoplasias, quimioterapia, radioterapia.

  1. INTRODUÇÃO

    A palavra câncer é derivada do grego “karkinos” e faz uma referência aos caranguejos e ao aspecto infiltrativo de tumores sólidos que incluem uma série de neoplasias malignas. Há a existência de relatos de pacientes com patologias que se assemelham ao câncer desde as civilizações antigas comprova que o câncer acomete os seres humanos a mais de três mil anos antes de Cristo. Com o avanço da tecnologia e dos métodos de diagnóstico laboratoriais atualmente é possível comprovar que esta enfermidade está intimamente associada a desordens genéticas (PEREIRA et al., 2015). A maioria das células do organismo possuem a capacidade de se multiplicar por meio de processos que são contínuos, chegando a morte. Entretanto existem casos em que as células alteram sua proliferação e se diferenciam das demais, não passando pelo processo de apoptose, levando assim à manutenção de novas células anormais. As neoplasias se caracterizam como novas formações que indicam um crescimento anormal do tecido que acaba se desenvolvendo mais rápido que os tecidos normais em sua volta, de forma descoordenada e persistente (ALMEIDA et al., 2005).

    A oncologia veterinária tem se firmado como uma área voltada ao tratamento de doenças neoplásicas com base em protocolos terapêuticos e cirúrgicos visando à melhoria e a qualidade de vida dos pacientes (SILVEIRA et al., 2010). Com a difusão de conhecimento a respeito da área de animais de companhia os tutores passaram a cuidar de forma mais adequada de seus animais, abandonando hábitos caseiros como a oferta de comidas e petiscos destinados a seres humanos e ofertando rações balanceadas (CARCIOFI et al., 2006).

    Outro aspecto em que foi possível observar mudança de comportamento está relacionado ao acompanhamento com médicos veterinários. De maneira geral, os atendimentos se tornaram mais frequentes, como a realização check-ups preventiva, colaborando assim para uma maior longevidade desses animais. O crescimento das populações de animais domésticos domiciliados, bem como o aumento da expectativa de vida, leva ao surgimento de uma nova problemática, sendo que as neoplasias podem ser consideradas nesse contexto uma vez que apresentam maior incidência em animais adultos e idosos (NARDI et al., 2002).

    Dentre os tumores mais frequentes em cães domésticos, é possível citar os carcinomas de células escamosas (CCE), que apresenta elevada prevalência em pacientes de idade avançada (SOUZA et al., 2006). O CCE é um tumor maligno que afeta as células produtoras de queratina, ou seja, os queratinócitos. Também pode ser descrito como carcinoma de células espinhosas, carcinoma espinocelular ou carcinoma epidermóide. Sua patogenia está associada principalmente a exposição a luz UV, falta de pigmentação na epiderme e alopecia (RIBEIRO et al., 2010).

    Sendo assim, o objetivo do seguinte trabalho é apresentar e discutir o uso dos principais tratamentos em tumores de células escamosas em cães.

  2. DESENVOLVIMENTO

    A compreensão da biologia dos tumores faz com que o oncologista tenha a capacidade de relacionar o desenvolvimento de uma determinada neoplasia com condicionantes intrínsecos e extrínsecos como: fatores genéticos, agentes infecciosos, condições ambientais e até mesmo alguma mudança de comportamento (ALMEIDA, 2005). Mesmo com os recentes avanços na área da genética e biologia molecular na oncologia, Silveira e Cols. (2010) em seu estudo, relatam que a morbidade por neoplasias apresenta uma representação significativa, indicando como uma das principais causas de óbitos em cães, o que leva os pesquisadores a buscarem novas técnicas e tratamento para essas doenças.

    A pele é o maior órgão do organismo e possui uma alta taxa de divisão mitótica, além de possuir uma gama de diferentes tipos celulares. Por ser um órgão extenso, o mesmo encontra-se na maior parte do tempo exposto ao meio ambiente, ao passo que as neoplasias cutâneas e subcutâneas acometem frequentemente cães e gatos. Enfermidades relacionadas ao tecido cutâneo representam aproximadamente 30 a 40% da rotina veterinária, sendo que ao se considerar os cães que possuem neoplasias, aproximadamente 30% tem acometimento cutâneo (FERNANDES et al., 2015). Entre os diversos tumores que se incluem nessa classificação, destaca-se os CCE, cuja etiologia não está cem por cento elucidada, porém sabe-se que acomete raças de pele clara e escura, como Dálmata, Poodle, Bull Terrier, Boxer entre outros, além de ser mais frequente em animais com lesões de pele causadas pelo excesso de exposição à radiação solar (VAIL, 2001).

    Os CCE se manifestam como uma massa solitária, verrugosa que pode evoluir para uma neoplasia ulcerada. O tratamento de eleição é a excisão cirúrgica do local preservando uma margem de segurança, podendo estar associada a tratamentos adjuvantes como a radioterapia e a quimioterapia, sendo a última discutida quando o paciente apresenta metástase (MORRIS, 2007).

    Das várias condutas terapêuticas no tratamento de CCE, a radioterapia é considerada uma importante ferramenta quando associada à cirurgia, sendo que a sua importância tem aumentado na Medicina Veterinária. A técnica é dividida em dois campos representados pela teleterapia, em que a radiação é emitida por um feixe externo; e a braquiterapia, na qual uma fonte radioativa é implantada próximo ao lugar do tumor. Em casos de CCE, a radioterapia é indicada em tumores primários e localizados, sendo associada a quimioterapia e cirurgia. A técnica tem como princípio incidir radiação ionizante sobre os tecidos neoplásicos com o objetivo de eliminar as células tumorais e impedir a sua multiplicação (ROSOLEM et al., 2012; VETTORATO et al., 2017).

    O protocolo radioterápico é administrado por frações em um período de 2 a 5 semanas, considerando o tipo, tamanho e localização do tumor, sendo necessário antes do início do tratamento submeter o animal a um exame clinico visando avaliar o seu estado físico. Nos casos em que o Médico Veterinário opte por utilizar a radioterapia como tratamento paliativo, este deverá ser realizado com grandes frações de radiação uma vez por semana ao longo de três semanas (VETTORATO et al.,2017).

    Outro tratamento utilizado na oncologia veterinária é a quimioterapia, que consiste na utilização de antineoplásicos tendo como alvo as células tumorais, visando manter a integridade das células saudáveis, podendo ser administrado por via oral ou intravenosa. Apesar disso, a maioria dos agentes quimioterápicos funcionam de forma inespecífica e acabam por produzirem danos nas células não tumorais. A utilização da quimioterapia se baseia em monitorar os parâmetros do paciente devido sua citotoxicidade, ao passo que fatores como peso, idade, estado nutricional, presença de metástase, tipo de tumor e condição de vida do paciente devem ser levadas em consideração (NARDI et al., 2002; SOUZA, 2006).

    Essa técnica vem sendo utilizada com frequência no tratamento de tumores malignos em animais de companhia, entretanto, para que o efeito antitumoral seja adequado, é necessário que o medicamento permaneça em concentrações terapêuticas no interior das células neoplásicas. Sendo assim, a eficácia de um medicamento antineoplásico tem influência com uma série de fatores como: espaço intersticial, transporte do fármaco pela corrente sanguínea quando esse depende de proteínas plasmáticas de ligação, heterogeneidade dos tecidos, entre outros (DOS ANJOS et al., 2016).

    A maioria dos medicamentos quimioterápicos possuem característica hidrofílica e são administrados por infusão, ao passo que também possuem características lipofóbicas levando o fármaco a entrar com dificuldade nas células e deixando de promover sua ação antineoplásica e causando toxicidade das células adjacentes. Frente a essa problemática, outras técnicas de tratamento antineoplásicos vem sendo desenvolvidas nos últimos anos para minimizar esses efeitos e direcionar a escolha dos fármacos corretamente (DOS ANJOS et al., 2016).

    Em casos de CCE, a quimioterapia pode ser administrada por vias tópicas, instralesionais e ou de forma sistêmica. Fármacos como Piroxicam, a Cisplatina, a Mitoxantrona e Bleomicina possuem atividade antineoplásicas, sendo as de eleição para lesões pré-neoplásicas em cães são o 5-fluorouracil (5%) e a cisplatina por apresentarem maior seletividade e melhor atividade. No caso da quimioterapia sistêmica, é realizada como suporte paliativo quando se observa a presença de lesões disseminadas e metastáticas. (ROSOLEM et al., 2012).

    A eletroquimioterapia, em associação com a quimioterapia, está sendo utilizada como uma ferramenta que aumenta a efetividade do tratamento de CCE, sendo empregada em combinação com fármacos de atividade antineoplásica. A eletroporação da célula tem o objetivo de maximizar o efeito intracelular e aumentar a ação citotóxica desses fármacos. O objetivo primordial da eletroquimioterapia é facilitar a entrada do quimioterápico no tecido tumoral e sua acumulação potencializando assim o seu efeito citotóxico (SILVEIRA et al., 2010).

    A eletroporação gera poros na membrana das células o que permite a entrada do quimioterápico ao interior das células tumorais. Além da eletroporação no sitio tumoral, a eletroquimioterapia promove a redução no fluxo sanguíneo no local levando as células a hipóxia e aumentando a acidez intracelular, favorecendo assim a necrose do tumor (SILVEIRA et al., 2016).

    Para que a eletroquimioterapia seja realizada com sucesso é necessário o uso de um gerador de pulsos que irá promover a eletroporação da membrana da célula. Segundo Silveira et al. (2010) a técnica é realizada com eletrodos que possuem oito agulhas de aço, localizadas paralelamente umas às outras, sendo que os pulsos gerados possuem tensão de 1000V em ondas quadradas durando aproximadamente 100μs totalizando oito ciclos de aplicação.

    Os medicamentos mais utilizados na eletroquimioterapia são a Bleomicina e a Cisplatina, ambos atuam no DNA das células e possuem dificuldades em atravessar a membrana celular. Com o auxílio dos pulsos gerados pelo tratamento, a seletividade e permeabilidade celular se alteram, fazendo com que um número maior de moléculas do fármaco entre no meio celular. Entretanto, algumas drogas como Carboplatina, Vincristina, Vimblastina, Paclitaxel, Dactinomicina, Doxorrubicina, Mitomicina C, Citarabina, Metotrexato, Gencitabina e Melfalano apresentam baixa potência na presença dos pulsos gerados pela eletroquimioterapia, chegando a ser insignificante (DOS ANJOS et al., 2016).

    A utilização da eletroquimioterapia frente a CCE já se mostrou efetiva nas regiões perianal, palpebral, lombar, facial e caudal. Como efeito adverso a este tratamento é possível citar a presença de processo inflamatório, sendo considerado como uma alteração de menor importância clínica quando comparada à presença do tumor (SILVEIRA et al., 2010).

  3. CONCLUSÃO

O CCE é uma doença grave e que tem como fator de patogenia a radiação por incidência de raios UV. Os tratamentos disponíveis no mercado, devem ser utilizados com precaução por Médicos Veterinários, na intenção de diminuir gastos desnecessários e principalmente, aumentar qualidade de vida dos animais assistidos por essas terapias. A conjugação de quimioterápicos como Bleomicina e Cisplatina associado a eletroporação é bastante citada na literatura como alternativa para CCE, sendo uma opção para casos mais graves, devido ao aumento da permeabilidade celular pela atividade e potencialização, sendo mais efetivo. O Médico Veterinário deve levar em consideração, a localização do tumor e o quimioterápico a ser aplicado para maior efetividade no tratamento.

REFERÊNCIAS

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CARCIOFI, A.C., PONTIERI, R., FERREIRA, C.F. , AND PRADA, F. Avaliação de dietas com diferentes fontes protéicas para cães adultos. Rev. Bras. Zootec. 754–760, 2006.DOS ANJOS, D.S. DOS, BRUNNER, C.H.M., AND CALAZANS, S.G. Eletroquimioterapia – uma nova modalidade para o tratamento de neoplasias em cães e gatos. Revista Investigação, 15 (1): 1-9, 2016.

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Recebido em: 30/12/2018
Aceito em: 29/03/2019


1 Cursando Medicina Veterinária pela Universidade Metropolitanas Unidas (FMU). Atualmente Técnico de Laboratório I em Instituto Butantan. Tem experiência em Bioterismo com enfase na criação e manutenção de modelos animais convencionais e modelos OGM, controle microbiológico, controle de natalidade das matrizes reprodutoras e rotina laboratorial.

2 Graduação em Biomedicina pela Universidade de Franca (UNIFRAN). Durante a graduação realizou monitoria em Ciências Morfológicas (anatomia, histologia e biologia celular) sob supervisão da Profa. Dra. Maria Antônia Noventa e Iniciação Cientifica Voluntária no Laboratório de Mutagênese, da Profa. Dra. Denise Crispim Tavares, sob orientação do Prof. Dr. Ricardo Andrade Furtado, realizando ensaios dentro de genética e toxicologia. Hoje, bolsista PROSUP/CAPES, nível mestrado, pelo Programa de Pós-graduação em Ciências Animal da Universidade de Franca com ensaios anti-inflamatórios sob orientação do prof. Dr. Ricardo Andrade Furtado. Compõe ainda, o quadro de docente nos curso profissionalizantes de Farmácia e Laboratório e Cuidador de Idosos da Euro Anglo unidade Franca. E-mail: [email protected]